Título: 'Brasil não agrava o efeito estufa'
Autor: John Vidal
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/02/2005, Vida &, p. A14

O Brasil é um grande emissor de gases, mas não contribuiu historicamente para o aquecimento global. Por isso, não pode ter sua responsabilidade nem suas emissões comparadas de forma eqüitativa às dos países desenvolvidos, diz o secretário-executivo da Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima, José Miguez. Veja entrevista ao Estado. Qual será a posição do Brasil nesse primeiro período de vigência do protocolo, até 2012?

O Brasil não tem compromissos no Protocolo de Kyoto quanto à redução ou limitação de emissões, mas tem vários compromissos dentro da Convenção (Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima). A lista inclui, por exemplo, elaborar o inventário de emissões, fazer planos de mitigação, proteger seus estoques de carbono e cooperar no desenvolvimento científico e tecnológico. Estamos atacando profundamente todos esses compromissos.

Há muitas reclamações de que o inventário nacional demorou demais para sair.

As pessoas reclamam, mas o nosso objetivo foi fazer o melhor possível. As dificuldades no cenário brasileiro são muito grandes. Nosso desmatamento é um território de 8 milhões de quilômetros quadrados! Então é diferente fazer um inventário na Holanda e no Brasil, mas as pessoas querem que a gente faça a mesma coisa. Além disso, não tivemos o recurso necessário - pedimos US$ 3 milhões e recebemos US$ 1,5 milhão. O prazo era 1999, mas, sinto muito, não deu para terminar.

Também criticam a demora para aprovar projetos do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Foi correta a posição de esperar pelo protocolo, ou vamos ficar para trás?

O Brasil sempre foi o pioneiro nessa história. Quem propôs o MDL fomos nós, portanto dizer que estamos atrasados é até irônico. A primeira autoridade nacional designada no mundo para aprovar projetos de MDL foi a brasileira. O primeiro projeto de MDL aprovado mundialmente foi brasileiro, da NovaGerar - de novo, fomos pioneiros. Esperamos o protocolo entrar em vigor, sim, mas não paramos nenhum processo. O segundo projeto aprovado no Brasil, da Vega Bahia, só não foi aprovado pelo Comitê Executivo do protocolo porque Bélgica e França ainda não têm autoridade nacional designada.

E quanto a novos projetos?

Do ponto de vista do setor privado, o risco da não entrada em vigor do protocolo depreciava os preços, por isso também era interessante esperar. Acho que agora vai haver uma nova submissão de projetos. O Banco Mundial estima que pelo menos 30 serão aprovados este ano no Brasil. Na prática, acho que teremos muito mais do que isso.

O Brasil pode ser considerado um grande emissor?

O Brasil é um grande emissor, mas não contribuiu para o agravamento do efeito estufa. A responsabilidade, como negociada no protocolo, não diz respeito apenas às emissões, mas ao que cada país vem fazendo desde a Revolução Industrial. Você tem de olhar quanto cada um causou de aumento da temperatura, e não o que foi emitido nesse ano ou naquele. O Brasil é um grande emissor, mas nossa industrialização é recente (1950) e o desmatamento na Amazônia também (1970). Se você pensar nos EUA e na Europa, eles fizeram isso em 1850 - o desmatamento, até muito antes.