Título: Mais de mil entidades contra a MP 232
Autor: Mariana Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/02/2005, Economia, p. B1

O repúdio à Medida Provisória 232 produziu ontem uma das maiores manifestações do setor privado contra o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mais de mil entidades e associações de prestadores de serviços - entre advogados, médicos, engenheiros, educadores e comerciários - lançaram em São Paulo um manifesto contra o aumento de carga tributária previsto na MP. Lido pela atriz Beatriz Segall, que representou a classe artística, o manifesto da chamada Frente Brasileira contra a MP 232 será entregue aos parlamentares amanhã em Brasília. A derrota do candidato do governo na eleição para a Câmara dos Deputados na madrugada de ontem animou os presentes. "Isso mostra a fraqueza da base governista e aumenta as chances de a MP 232 ser derrubada", declarou o presidente da Associação Comercial, Guilherme Afif Domingos. "Estou seguro de que a medida não será aprovada. O ônus político de defender algo que não tem apoio na sociedade é muito grande", completou o presidente do Centro das Indústrias de São Paulo (Ciesp), Cláudio Vaz.

Para o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o governo deveria retirar a MP. "Se não fizer isso, vai perder de novo no Congresso", disse Paulinho, que também preside o PDT paulista. Em janeiro, o partido apresentou ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra a MP.

Editada no dia 31 de dezembro, a MP 232 foi anunciada como um pacote de bondades ao corrigir em 10% a tabela do Imposto de Renda de Pessoas Físicas. Em contrapartida, aumentou em 25% a base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e do IR de prestadores de serviço. A MP ampliou ainda o número de categorias que devem reter imposto na fonte e reduziu o poder dos Conselhos de Contribuintes, que julgam disputas entre empresas e a Receita Federal.

Lançada pelo Conselho Regional de Contabilidade do Paraná, junto com o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), no início de janeiro, a Frente logo ganhou a adesão da associação comercial e da classe médica paulistas, que nacionalizaram o movimento. Com a proximidade do ato, dezenas de entidades aderiram, até chegar a 1.111.

Pelos cálculos do IBPT, do início do governo Lula a janeiro de 2006, quando todos os artigos da MP 232 estiverem em vigor, o aumento da carga tributária do setor de serviços será de 63%. "Mais de 100 mil trabalhadores poderão perder o emprego e outras tantas empresas irão para a informalidade", afirmou o presidente do IBPT, Gilberto Amaral.

A Ordem dos Advogados do Brasil, que também entrou com uma Adin contra a MP, criticou o excesso de medidas provisórias. "Onde está a relevância, a urgência e a emergência na matéria tributária que trata da MP 232?", reagiu o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio D'Urso.

Para Beatriz Segall, a MP 232 vai inviabilizar o teatro e a cultura no País. "Como se não bastasse a total falta de apoio deste governo para a cultura, agora temos mais essa lei antipática e autoritária. Vai ficar muito difícil fazer teatro no Brasil." Até o Sindicato Nacional dos Auditores da Receita Federal (Unafisco) aderiu ao coro contra a MP 232. "Em vez de aumentar a carga tributária das prestadoras de serviços, o governo deveria sobretaxar o lucro dos bancos", propôs a presidente do Unafisco, Maria Lúcia Fattorelli.

A Frente tem audiência amanhã com os novos presidentes do Senado e da Câmara. Perguntado se pretendia dialogar com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, Afif Domingos respondeu que "não negocia com seqüestrador". "É como seqüestrar e botar a faca no pescoço. Não há diálogo. Não fomos consultados antes da edição da MP. A não ser que seja para o governo dizer que vai retirar a MP e apresentar projeto de lei."

A questão de dialogar ou não com o Executivo provocou mal-estar entre a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Frente. Apesar de se declarar contra a MP 232, a Fiesp não assinou o manifesto. Seu presidente, Paulo Skaf, que iria se pronunciar durante o protesto, apareceu de relâmpago, deu entrevistas e saiu antes do fim.

Skaf, cuja eleição na Fiesp teve o apoio do governo federal, esteve com Palocci na sexta-feira e vai encontrar-se com o ministro amanhã para tratar da MP 232. Nos corredores do Clube Esperia, onde foi realizado o ato, comentava-se que Skaf teria sido enviado pelo governo para tentar reduzir o impacto negativo que a MP tem provocado à imagem do governo.