Título: Derrota muda plano de Lula para novo ministério
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/02/2005, Nacional, p. A8

A surpreendente derrota governista na eleição para a presidência da Câmara, escancarando traições de partidos aliados como PTB, PMDB e PP, terá impacto direto na reforma ministerial. Depois da escolha de Severino Cavalcanti (PP-PE), um autêntico representante do baixo clero, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva garantiu a interlocutores que pretende fazer um governo de coalizão, compartilhando o poder. Mas, antes de desalojar o PT de algum ministério, quer saber com quem pode contar. A primeira mudança providenciada pelo Palácio do Planalto será mesmo na articulação política da Câmara. Até agora, o mais cotado para substituir o atual líder do governo, Professor Luizinho (PT-SP), é o deputado José Eduardo Martins Cardozo (SP), também petista. Cardozo não é do grupo de Lula, mas, no meio político, é considerado hábil negociador, perfil desejado pelo Planalto neste momento.

O presidente chegou até a comentar, antes da eleição de segunda-feira, que Cardozo seria um bom nome para comandar a Câmara. Diante da disputa interna no PT, porém, ele foi um dos que desistiram em favor de Luiz Eduardo Greenhalgh.

No Planalto, a avaliação é de que o comando político do governo perdeu a primeira batalha para o projeto de reeleição de Lula, em 2006, mas não a guerra. "O PT vai tirar lições dessa derrota e não será empecilho para o presidente na reforma ministerial", assegura o presidente do partido, José Genoino. "Vamos diminuir a arrogância."

Nas fileiras do PT há quem defenda a troca do ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo. Amigos de Lula chegam a dizer que a divisão da Casa Civil, comandada por José Dirceu, foi um erro. "De jeito nenhum. Aldo é o porta-voz dos não-petistas no governo", reage o presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ).

Em reunião com Lula, marcada para hoje, o núcleo político do governo vai avaliar como recompor a base de sustentação o mais rápido possível, curar as feridas e ampliar o diálogo com os partidos. O que ainda não se sabe é o tamanho da reforma. Traduzindo: a dúvida é se dispensar melhor tratamento à base significa ceder aos apelos fisiológicos dos infiéis. Pelo visto, não.

ROSEANA

Num claro sinal de que cumpre acordos e prestigia os aliados, o governo promete nomear a senadora Roseana Sarney (PFL-MA) para um ministério. Roseana deve se desfiliar do PFL e entrar na cota do ex-presidente do Senado José Sarney (PMDB-AP), que tem ajudado o Planalto. A articulação pró-Roseana foi montada ainda no ano passado pelo líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), abrindo caminho para a pacificação entre Sarney e Renan Calheiros (PMDB-AL), eleito presidente da Casa.

Mercadante sai fortalecido do episódio, ao contrário do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP). Os dois vão disputar prévia, em 2006, para escolha do candidato do PT ao governo de São Paulo, provavelmente com a ex-prefeita Marta Suplicy.

No PP de Severino Cavalcanti, a expectativa é ganhar um ministério robusto. "Nós somos um partido muito mais forte agora", afirma o presidente do PP, deputado Pedro Corrêa (PE). Antes da eleição na Câmara, estava certo que o deputado Pedro Henry (PP-MT) ocuparia um cargo na Esplanada. Agora, nem tanto. Dentro do governo, há duas alas: uma argumenta que o PP traiu Lula ao despejar votos em Severino e não em Greenhalgh e, portanto, não deve receber cargo nenhum. Outra acha que, se o Planalto não der um ministério ao PP, sofrerá represálias na Câmara.

Dividido em muitas facções, o PMDB tende a ficar do mesmo tamanho na reforma, mas pode haver troca de ministros. Atualmente, o partido comanda os ministérios das Comunicações, com Eunício Oliveira, e da Previdência, com Amir Lando. "O grau de infidelidade peemedebista foi muito alto na eleição da Câmara", observa um interlocutor de Lula.

Antes das eleições no Congresso, Lula pedira a Renan que indicasse um nome do partido para representar o Senado no governo, já que no próprio PMDB Lando é considerado um ministro enfraquecido. "Nada está definido", desconversa Renan. "No momento, essa questão não está posta."