Título: Esforço do crediário para absorver alta está no fim
Autor: Márcia De Chiara
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/02/2005, Economia, p. B4

O fôlego das lojas e das financeiras para absorver a elevação da taxa de juros básicos sem repassar a alta para o consumidor pode estar chegando ao fim. Grandes redes varejistas não admitem abertamente a elevação dos juros ao consumidor por causa da concorrência acirrada. Mas já consideram a possibilidade de reduzir nas próximas semanas o número de promoções focadas nas taxas de juros. "O impacto da elevação da Selic deverá ocorrer nas próximas semanas para o consumidor", prevê Érico Sodré Quirino Ferreira, presidente da Acrefi, entidade que reúne as financeiras. Segundo ele, o esforço das financeiras de bancar seis elevações consecutivas sem repassá-las ao cliente para não perder mercado prejudicou as margens. Agora com a Selic subindo de 18,25% para 18,75% ao ano não seria mais possível suportar a alta de juros. Ele lembra que nenhuma empresa anuncia aumento de taxas.

"O comércio vai ter que repassar a alta porque ninguém quer perder", diz o presidente da Federação dos Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio). Abram Szajman. Ele pondera, no entanto, que as tabelas não serão reajustadas imediatamente.

O presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Guilherme Afif Domingos, acredita que a elevação dos juros poderá provocar agora um repasse para os preços e uma redução nos prazos do crediário.

Szajman lembra que o governo precisa, com urgência, diminuir os juros e iniciar um programa de reforma da máquina administrativa para cortar gastos. O presidente da Fecomercio ressalta que, a cada aumento de 0,5 ponto porcentual na Selic, o custo da dívida pública cresce cerca de R$ 5 bilhões, o que equivale a 25% da arrecadação total da CPMF, por exemplo. "A elevação dos juros amplia os compromissos financeiros do governo, o que acaba exigindo mais impostos. É um círculo vicioso que precisa ser interrompido."

INADIMPLÊNCIA

Dados da ACSP divulgados ontem mostram que o espaço para as lojas absorverem a elevação dos juros sem repassar para o consumidor diminuiu. Na primeira quinzena deste mês, o número de carnês inadimplentes que foram recuperados cresceu 2,4% em relação aos mesmos dias do ano passado. O ritmo foi bem abaixo do aumento da inadimplência, que cresceu 12,1% no mesmo período.

O economista da entidade, Emílio Alfieri, lembra que até o mês passado o cenário era inverso. O ritmo de alta dos carnês recuperados era superior ao dos inadimplentes. "É preocupante porque vai chegar uma hora que a inadimplência vai crescer num ritmo maior, como ocorre geralmente a partir março, reduzindo o espaço para as lojas e financeiras absorverem as altas de juros sem repasses ao consumidor."

Enquanto grandes redes de varejo avaliam o impacto da alta da Selic, ajustes pontuais começam a ocorrer. As Lojas Colombo, por exemplo, informam que não pretende aumentar os juros. "Mas para enfrentar essa nova alta da Selic poderemos reduzir o número de promoções focadas nas taxas de juros", diz o diretor Comercial da rede, Marcelo Scarabichi. Ele lembra que o mercado está muito competitivo e, como o período é de demanda baixa, não é conveniente aumentar taxas no momento.

"Vamos trabalhar com um volume menor de promoções com juros reduzidos", diz o diretor das Casas Bahia, Michael Klein. A rede informa que desde de setembro não elevou juros, mas, como vem reduzindo as promoções com juros, a taxa média, na prática, subiu. As Lojas Cem também não pretendem aumentar juros. Mas a rede está preocupada com o impacto negativo da alta da Selic.