Título: No PI, maior fraude do Bolsa-Família
Autor: Luciano Coelho
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/01/2005, Nacional, p. A10

No momento em que o programa Fome Zero completa dois anos, o governo não tem muito o que comemorar. Além dos tropeços, da burocracia, das confusões e trocas de comando que o fizeram patinar desde o início, uma grande fraude - talvez a maior até agora - foi descoberta em Teresina, no Piauí, no pagamento de benefícios do Bolsa-Família. Como descobriu a própria prefeitura, nada menos que 1.107 de seus funcionários estavam inscritos no programa e vinham recebendo mensalmente as verbas, de forma fraudulenta. Os pagamentos já foram suspensos, o dinheiro terá de ser devolvido ao governo e o Ministério Público investigará o caso para punir os responsáveis. É a segunda vez que uma possível festa vira decepção. Meses atrás, outra irregularidade foi denunciada quando o Planalto preparava uma grande solenidade em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciaria que o Bolsa-Família - que herdou as metas, os recursos e os holofotes do Fome Zero - havia chegado aos 5 milhões de beneficiados.

A prefeitura de Teresina identificou a fraude quando fazia o recadastramento para unificar programas sociais. O cruzamento dos dados com a folha de pagamento e outras informações revelou várias irregularidades. O programa dá de R$ 50 a R$ 95 a famílias que têm até R$ 100 de renda per capita.

A apuração será coordenada pela prefeitura, mas a diretora do Cadastro Único da Secretaria de Renda e Cidadania, Lúcia Modesto, já está na cidade para acompanhá-la. "Vamos apurar criteriosamente, sem nenhuma concessão ou procedimento que fira a lei do Bolsa-Família", frisou o ministro Patrus Ananias, que está em Porto Alegre, no Fórum Social Mundial.

Ele disse que a identificação da fraude é parte de uma ação conjunta para aumentar a transparência dos programas sociais. "Nós disponibilizamos todas as informações do cadastro para as prefeituras. A partir daí os casos foram identificados e o Ministério Público foi acionado para adotar as medidas legais cabíveis", contou. "A ação (no MP) está dentro de nossos processos de parceria e é um exemplo de cooperação."

Segundo a secretária municipal do Trabalho e Ação Comunitária, Umbelina Carvalho, o maior número de irregularidades está na Vila Irmã Dulce, a primeira favela onde esteve o presidente Lula depois de eleito. Já foram identificadas fraudes também em Guaribas, município berço do Fome Zero. Em várias outras cidades também foram feitas denúncias de fraude.

CRUZAMENTO DE DADOS

A Empresa de Processamento de Dados do Piauí (Prodepi) se ofereceu para fazer o cruzamento dos dados do cadastro do Bolsa-Família de todos os municípios do Estado. O diretor da Prodepi, Antônio Torres, explicou que basta que os prefeitos enviem à empresa os dados magnéticos dos cadastros.

Ele disse que se receber os dados pode cruzá-los com a folha de pagamento e em 24 horas saber se há outros casos de servidores recebendo o benefício irregularmente. "Tudo vai depender do grau de dificuldade. Temos de cruzar dados, observar abreviaturas, ver homônimos e dados incompletos", explicou. "Estamos abertos para a transparência e queremos que isso seja feito em todos os municípios."

Ao todo são cerca de 225 mil famílias inscritas no Bolsa-Família no Piauí. O resultado do cruzamento será enviado às Secretarias de Administração e de Assistência Social e Cidadania do Piauí e ao Ministério Público Federal.