Título: OMS não quer adiar acordo antifumo
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/01/2005, Vida &, p. A14

O Brasil enfrentará uma dura resistência diplomática se quiser tentar adiar a primeira conferência internacional entre os países que ratificaram o acordo de controle do tabaco. Pelas regras do tratado, os governos têm um ano para realizar sua primeira conferência, que servirá para lançar medidas concretas para combater o fumo. Na segunda-feira, em Genebra, os países se reúnem em nível técnico para avaliar como ocorrerá essa conferência internacional. Mas sem ter ratificado o tratado, o governo brasileiro quer convencer os demais a adiar a conferência. A estratégia seria a de dar mais tempo para que o Senado ratifique o acordo, permitindo a participação do Brasil entre os países que irão formular as futuras políticas no setor. O prazo limite para a conferência é até fevereiro de 2006. Mas nada impede que a reunião seja feita antes disso. E a expectativa era de que ela seria marcada para abril ou maio deste ano. E é esse prazo que o governo brasileiro pretendia adiar para mais perto do fim do ano.

"Os prazos para a realização da primeira conferência estão fixados em um dos artigos do acordo que já foi assinado. Não se pode fazer mudanças", afirmou Vera da Costa e Silva, diretora do programa da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o controle do cigarro. A especialista é uma das maiores críticas da posição do Senado brasileiro, que estaria barrando a adesão do País ao acordo. "O lobby da indústria é forte e o Brasil só perde ficando fora da convenção", afirmou.

Entre 2000 e 2003, o Brasil chefiou as negociações para a criação do acordo e o atual chanceler, Celso Amorim, foi o primeiro presidente dos debates. Em Genebra, a não participação do País no acordo, já ratificado por 51 governos, está gerando um desconforto entre negociadores. No Brasil, senadores alegam que o País precisa saber qual será o impacto sobre seus produtores de tabaco antes de aceitar tal entendimento.

Pelo acordo, os países que o ratificarem se reuniriam para adotar medidas concretas, como a elevação de impostos e restrições à publicidade. Segundo negociadores em Genebra, vários países que já adotaram o documento querem realizar a reunião assim que possível. "Ninguém quer ficar esperando um outro poder legislativo no interior de um país decidir aprovar um acordo para que o tema seja debatido. A regra era clara: com 40 ratificações o tratado entrava em vigor. Já temos mais do que isso e temos de seguir", afirmou um diplomata de um país que já aderiu ao acordo.

MITOS

Um documento obtido pelo Estado e preparado pela OMS derruba as alegações dos produtores de fumo do Brasil, que afirmam que o tratado irá provocar desemprego no setor. Segundo a avaliação, alguns dos países com as maiores "economias do tabaco" já ratificaram o acordo e irão começar a adotá-lo. "Este é um dos tratados mais aceitos da história da ONU", afirma o documento, que lembra que poucas vezes um acordo entrou em vigor apenas dois anos depois de sua criação.

Dos 15 maiores produrores de tabaco do mundo, quarto já aderiram ao tratado: Índia, a terceira maior produtora mundial, Turquia, onde o governo tem o monopólio da fabricação de cigarros, Paquistão e Tailândia. "Esses países são importantes produtores, mas isso não os impediu de se tornarem parte do acordo", afirma o documento, que lembra que o Brasil foi o segundo maior produtor de fumo e o décimo maior fabricante de cigarros em 2004.

Outra forma de desmistificar o argumento brasileiro apontado pela OMS é um estudo da FAO, agência da ONU para a Alimentação, que afirma que nos próximos dez anos haverá uma migração da produção do tacabo dos países ricos às economias emergentes.