Título: Zapatero cobra regras mais claras para investir e quer contrapartidas
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/01/2005, Nacional, p. A4

Disposto a iniciar um novo ciclo de investimentos no Brasil, o governo socialista do primeiro-ministro José Luis Zapatero, da Espanha, fez ontem uma clara advertência ao País: é preciso criar marcos jurídicos que sustentem a injeção de recursos, principalmente pelas pequenas e médias empresas espanholas e por companhias interessadas em projetos de infra-estrutura na América do Sul. Em seu discurso, no Palácio do Planalto, Zapatero disse também que "o Brasil já ganhou o futuro" e que as empresas espanholas querem investir no País. Mas também deixou claro que seu governo espera maior presença de companhias brasileiras na Espanha. "A Espanha é o segundo maior investidor externo neste país. As empresas espanholas estão contentes neste país. Há mais empresas espanholas que querem investir no Brasil. Mas temos que criar uma suficiente capacidade de mobilização econômica, de adequar os marcos jurídicos para que isso se possa concretizar em um investimento maior", declarou o primeiro-ministro, referindo-se especialmente às condições necessárias para a presença de pequenas e médias empresas espanholas no Brasil. "Marcos jurídicos" foi a expressão com que ele se referiu aos marcos regulatórios que definem, no longo prazo, as garantias para os investidores - regras que o Brasil já aprovou nos setores de energia e telefonia.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva nada comentou sobre o funcionamento desses marcos no País - um dos problemas mais sérios para a entrada de investimentos estrangeiros. Preferiu lançar um desafio aos grupos financeiros espanhóis e brasileiros para a criação de mecanismos de financiamento de pequenas e médias empresas e "convidar os homens de negócios" dos dois países a investir em projetos de infra-estrutura de integração da América do Sul.

Brasília foi a primeira escala da viagem inaugural de Zapatero à América Latina - hoje ele segue de São Paulo para a Argentina e, depois, para o Chile. Antes de encontrar Lula, o primeiro-ministro visitou o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.

RECIPROCIDADE

"As relações econômicas, os investimentos e as exportações da Espanha no Brasil e do Brasil na Espanha vão aumentar. Essa é a vontade recíproca de ambos os governos", disse também Zapatero no discurso no Planalto, ao chamar a atenção para a necessidade de reciprocidade na atuação dos agentes econômicos. Apesar das expectativas em relação a um novo fluxo de investimentos espanhóis no Brasil, a reunião entre Lula e Zapatero, no Palácio do Planalto, foi marcada por um certo esvaziamento. Da área econômica do governo brasileiro, apenas Roberto Rodrigues, da Agricultura, esteve presente para assinar um entendimento nas áreas de controle sanitário e fitossanitário.

Na prática, projetos e condições para os novos investimentos só começam a ser discutidos daqui a um mês, quando se realiza o Fórum de Investimentos e de Cooperação Empresarial - marcado para 25 e 26 de fevereiro, em São Paulo. Um outro evento será a primeira reunião bilateral sobre financiamento de obras de infra-estrutura. Entre as parcerias a serem analisadas estão os "projetos no setor gás-químico" em países ibero-americanos - em princípio, a Bolívia seria um alvo.

Outra decisão, na Declaração de Brasília, foi aperfeiçoar o Plano de Parceria Estratégica, assinado em 2003. Brasília e Madri comprometeram-se também a apoiar as iniciativas recíprocas nos foros multilaterais.

Nenhum dos dois tocou, nos discursos, nas dificuldades que atravancam o acordo de livre comércio entre a União Européia e o Mercosul. Eles preferiram mencionar, no documento final, o compromisso para alcançar um "resultado equilibrado e ambicioso" nessas discussões. Além da Declaração de Brasília e do entendimento na área agrícola, os dois assinaram dois acordos na área de turismo - a oferta de tecnologia do portal de turismo do governo espanhol para o Brasil e a colaboração em cinco áreas do setor. Também firmaram um acordo de implementação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo do Protocolo de Kyoto.