Título: Real em alta não afeta contas externas
Autor: Sheila D'Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/02/2005, Economia, p. B1

As queixas do empresariado de que a valorização do real em relação ao dólar está reduzindo as exportações brasileiras ainda não se refletiram no resultado das contas externas, que fecharam o mês de janeiro com um saldo positivo de US$ 818 milhões nas transações de bens e serviços do Brasil. Foi o recorde para o mês. Isso ocorreu apesar de os gastos com viagens, contratação de seguro, aluguel de equipamentos e pagamento de royalties terem quadruplicado em relação a janeiro de 2004. Juntas, essas despesas, que estão contabilizadas na conta de serviços, passaram de um déficit de US$ 71 milhões, no primeiro mês de 2004, para US$ 272 milhões, no mês passado. Além disso, as remessas de lucros e dividendos pesaram negativamente no saldo das contas externas, já que aumentaram 300% no período, passando de US$ 94 milhões para US$ 372 milhões.

Segundo o chefe do Departamento Econômico do Banco Central (Depec), Altamir Lopes, essas despesas são conseqüência da retomada do crescimento econômico. "Com o aumento do nível de atividade, é natural que atividades voltadas para a produção fiquem mais elevadas."

Quanto às remessas de lucros ao exterior, Lopes disse que se trata de um movimento sazonal. "Nos primeiros meses do ano, as empresas estão apurando e remetendo para as matrizes lucros que tiveram no ano passado. E 2004 foi um ano de crescimento e resultados bem melhores do que 2003."

O que compensou todos esses gastos foram as receitas obtidas com a comercialização de produtos brasileiros no exterior. As exportações cresceram 28,3% no mês passado, comparado com janeiro de 2004, e atingiram US$ 7,4 bilhões. O crescimento da economia também tem impulsionado as importações, que subiram num ritmo menor: 24,8%, fechando o mês passado em US$ 5,2 bilhões. Com isso, no período de 12 meses terminado em janeiro, o Brasil apresenta superávit de US$ 11,7 bilhões, valor que é também recorde histórico.

Para fevereiro, o BC estima que o saldo das transações correntes será novamente positivo, mas em montante inferior ao de janeiro: US$ 500 milhões. O aumento das remessas de lucros e de dividendos deverá contribuir para derrubar o resultado. Até ontem, essas despesas somavam US$ 833 milhões, mais do que o dobro dos US$ 372 milhões de janeiro. Além disso, os gastos com juros incidentes sobre a dívida vão superar o US$ 1,021 bilhão do mês passado. Em 21 dias deste mês, essas despesas já estão em US$ 1,050 bilhão.

INVESTIMENTOS

Na avaliação de Altamir Lopes, os dados relativos ao ingresso de investimentos estrangeiros diretos confirmam a tendência de recuperação verificada recentemente. Em janeiro, o País recebeu US$ 1,2 bilhão, um crescimento de 23% em relação a janeiro de 2005. A maior parte desse dinheiro, 63,4%, foi direcionada para a indústria. Do restante, 29,1% foram para empresas de serviços e 7,5% para agricultura e pecuária.

Este mês, o ingresso de investimentos diretos, segundo Lopes, continua forte. Até ontem, o BC havia registrado entrada de US$ 700 milhões e a expectativa é encerrar o mês com US$ 800 milhões. "Isso é altamente positivo e surpreende porque fevereiro é um mês curto e com poucos negócios", destacou o chefe do Depec.

Em fevereiro, o montante de US$ 1,902 bilhão captado pela governo com o lançamento de bônus no exterior também deverá reforçar as reservas internacionais do País. Com isso, dos US$ 4,5 bilhões que o Brasil precisará obter lá fora para cobrir os pagamentos da dívida externa que serão efetuados, restam apenas US$ 2,598 bilhões.

Além das emissões de títulos no exterior, o governo tem reforçado as reservas do País comprando dólares do mercado. Em janeiro, o BC adquiriu US$ 2,566 bilhões, contribuindo para evitar que o real se apreciasse ainda mais em relação ao dólar. Este mês, até ontem, essas compras já somam mais US$ 2,721 bilhões. Além disso, o BC vem negociado contratos especiais de câmbio (chamados de swap cambial reverso) com o objetivo de tentar desestimular as operações nos mercados futuros, que, por sua vez, contribuem para puxar a cotação do dólar para baixo.

Apesar de tudo isso, não tem sido possível frear a queda da moeda americana em relação ao real. Na melhor das hipóteses, as medidas contribuem para não deixar o real se valorizar ainda mais.