Título: O Rodoanel na vitrine
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Fonte: O Estado de São Paulo, 28/02/2005, Editorial, p. A3

O governo federal parece, finalmente, ter percebido que o Rodoanel Mário Covas não é uma obra de importância só para São Paulo ou para o PSDB, do governador Geraldo Alckmin. Graças à pressão exercida pelo Estado, pelos prefeitos da região do ABC, por empresários do setor de transporte de carga e pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou ao ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, que a obra fosse tratada "com todo o interesse". Na terça-feira, o governo federal anunciou investimentos de R$ 700 milhões na construção d o Trecho Sul do anel rodoviário.

A União cumpre, em parte e com grande atraso, convênio firmado em 1988 com o Estado e a Prefeitura. O Ministério dos Transportes deveria arcar com 25% do custo da obra, assim como a Prefeitura. Nenhuma das duas esferas de governo, no entanto, honrou o compromisso. Atolada em dívidas, a administração municipal não colaborou com um centavo sequer na construção do Trecho Oeste, concluído, na quase totalidade, com recursos do Estado. Os repasses da União ficaram longe de atingir o que foi estabelecido e chegaram sempre com atraso.

Sem recursos para bancar os R$ 2,5 bilhões necessários para o Trecho Sul (R$ 1,9 bilhão para a construção e R$ 660 milhões para compensações ambientais) e cansado de esperar pela participação da União, o governador Geraldo Alckmin anunciou, no dia 14, sua intenção de seguir sozinho com a construção. Com R$ 750 milhões reservados na versão estadual do Plano Plurianual de Investimentos 2004/2007, decidiu construir a ligação entre Mauá e a Rodovia dos Imigrantes, em São Bernardo do Campo, um trecho com 15 quilômetros de rodovia e 6 quilômetros de acessos e vias municipais.

O trecho se unirá à Avenida Papa João XXIII, em Mauá, que, por sua vez, se ligará à Avenida Jacu-Pêssego. Essa via está sendo prolongada pela Prefeitura de São Paulo, até a Rodovia Ayrton Senna. Os motoristas que chegarem à capital pela Ayrton Senna seguirão pelas duas avenidas municipais, depois pelo Rodoanel, até atingirem a Rodovia dos Imigrantes, principal acesso ao Porto de Santos. Ficarão livres das congestionadas Marginais do Tietê e do Pinheiros e da Avenida dos Bandeirantes.

Até recentemente o governo federal não atribuía importância à obra. O Orçamento Plurianual da União dedicou apenas R$ 35 milhões ao Rodoanel até 2007, o que corresponderia a 1,4% do valor atual do Trecho Sul. Os petistas também anularam o esforço da bancada paulista na Câmara dos Deputados que aprovou, por unanimidade, emenda orçamentária destinando R$ 142 milhões para a construção neste ano. O valor caiu para R$ 31 milhões na versão final do Orçamento Anual.

Não dispondo o Estado de recursos suficientes e não estando o governo federal disposto a financiar uma obra que pode render dividendos eleitorais ao governador Geraldo Alckmin, o mais importante trecho do Rodoanel foi reduzido a uma extensão de 15 quilômetros. Essa meia medida frustrou o empresariado e as prefeituras da região onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou a sua vida sindical e política. Juntos, prefeitos e empresários decidiram pressionar o governo federal.

Segundo o prefeito de São Bernardo, William Dib (PSB), presidente do Consórcio Intermunicipal do ABC, a construção de todo o Trecho Sul do Rodoanel permitirá baratear em 30% o preço final dos produtos escoados pela região.

Em conjunto, os Trechos Oeste e Sul ligarão as Rodovias Anhangüera, Bandeirantes, Castelo Branco, Raposo Tavares, Régis Bittencourt, Imigrantes, Anchieta e Ayrton Senna.

Para que o governo federal percebesse tudo isso, foi preciso que o Estado anunciasse a licitação do primeiro lote, para julho, e que os empresários manifestassem seu descontentamento com a atitude do governo federal. Os petistas constataram que os obstáculos financeiros não impediriam o governador Geraldo Alckmin de construir o Rodoanel e, uma semana depois da apresentação do plano estadual aos prefeitos do ABC e empresários, a União voltou atrás e decidiu investir na obra. O Orçamento Plurianual será modificado, destinando R$ 140 milhões anuais, até 2010, para o Rodoanel.