Título: Severino deve arquivar representação do PSDB contra Lula no Congresso
Autor: Vera Rosa, Colaborou: Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/02/2005, Nacional, p. A4

O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), deverá arquivar nesta semana a representação para abertura de processo por crime de responsabilidade contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O pedido foi apresentado na sexta-feira pelo PSDB, um dia depois de Lula ter revelado, em discurso no Espírito Santo, que mandou o dirigente de uma empresa estatal silenciar sobre um suposto esquema de corrupção no governo de Fernando Henrique Cardoso. Em conversas com interlocutores do governo, Severino garantiu que não alimentará uma crise política artificial. "Não dá para fazer um cavalo de batalha em cima disso", afirmou o presidente da Câmara, que atribui boa parte da novela à antecipação da disputa eleitoral de 2006, na qual o governo do PT e o PSDB vão se enfrentar. "Não vejo como desdobrar essas declarações em crise. É preciso fazer todo esforço para baixar a temperatura", completou o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Mesmo assim, o Palácio do Planalto não se dará por satisfeito na queda-de-braço com o PSDB e tentará blindar Lula de novo bombardeio, acusando os tucanos de quererem desestabilizar o governo, o País e a democracia. Para o público externo, Severino tem dito que ainda vai avaliar o pedido dos tucanos. O deputado estava ontem no Rio Grande do Sul, visitará hoje Rondônia e Amazonas e só retornará a Brasília amanhã.

Levado em banho-maria pelo Planalto, o PP de Severino e do ex-prefeito Paulo Maluf virou agora a noiva cortejada pelo governo. Ainda ontem, antes de viajar para Nova York - onde terá reunião na ONU sobre as Metas do Milênio -, o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, telefonou para dirigentes do PP. Assegurou que a reforma ministerial sairá neste mês e que o PP será contemplado. Dirceu informou que estará "à disposição" depois de sua volta, na quinta-feira.

INTERESSE

"O interesse é mais do governo do que nosso", desconversou o líder do PP na Câmara, José Janene (PR). O presidente do PP, deputado Pedro Corrêa (PE), disse não ver motivo para abertura de processo por crime de responsabilidade contra Lula, que, numa possibilidade muito remota, poderia desembocar em impeachment. "Foi um tropeço verbal e não devemos superdimensionar o lapso", afirmou.

Irônico, o deputado Raul Jungmann (PPS-PE) não se conteve. "Que situação! O governo do PT virou refém do Severino", observou. Ele entrará hoje na Procuradoria-Geral da República com pedido de investigação de "crime de prevaricação" por parte do presidente.

Lula ficou muito irritado com notícias de que estaria ensaiando um recuo em suas declarações quando falou em "discurso atravessado" durante solenidade sobre reforma universitária. "Assim já é demais!", exclamou o presidente, ao ler os jornais de sábado. Ao pedir para a platéia não deixar os sonhos caírem por terra por causa de um "discurso atravessado", Lula estava se referindo, de acordo com um interlocutor palaciano, à polêmica em torno das propostas para criação da Agência Nacional de Cinema e Audiovisual (Ancinav) e do Conselho Federal de Jornalismo. Apesar de surpreso com o tamanho da repercussão de seu discurso, Lula não aceita fazer retratação pública, como pediu Fernando Henrique.