Título: TV digital dá mais controle ao espectador
Autor: Renato Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/12/2005, Economia & Negócios, p. B14

Sistema brasileiro põe a internet na tela e oferece serviços interativos

A televisão sempre foi burra. Não, isso não tem nada a ver com a qualidade do conteúdo, mas com a tecnologia, em que a inteligência se encontra no centro da rede, nas emissoras, e os televisores oferecem poucas opções aos espectadores, como mudar de canal ou desligar. A partir do ano que vem, tudo começa a mudar. O Sistema Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD), desenvolvido por pesquisadores locais, promete criar aqui, se deixarem, a TV aberta mais interativa do planeta. Às vezes ela se parece com a internet. Ou vai além. O televisor - ou o conversor, que converte o sinal digital em analógico, para ser visto nos aparelhos atuais - tem capacidade de processamento e de armazenamento como um computador. A inteligência estará ao alcance dos dedos do espectador pelo controle remoto ou teclado sem fio.

A Universidade Federal da Paraíba (UFPB) demonstrou na sexta-feira uma aplicação de torcida virtual durante evento na Universidade de São Paulo (USP). "Queremos levar para a TV a experiência coletiva de assistir a um jogo de futebol no estádio", diz Guido Lemos, professor da UFPB. Com a torcida virtual, a imagem é a mesma transmitida pela emissora, mas o som é dos torcedores. Se tiver um canal de retorno, como um telefone ligado à televisão, o espectador pode comentar e torcer com amigos que estão em várias partes do País ou do mundo. A UFPB liderou um dos 22 consórcios do SBTVD. O grupo desenvolveu o FlexTV, um middleware, software que funciona como o sistema operacional do computador, fazendo com que os aplicativos tenham acesso a recursos do equipamento.

Além da torcida virtual, o consórcio da UFPB demonstrou uma aplicação de educação a distância, que usa gravador digital de vídeo. Em inglês, Digital Video Recorder (DVR) ou Personal Video Recorder (PVR). Navegando por um menu na tela da televisão com o controle remoto, o professor programa o vídeo de que precisará para a próxima aula. Se ele for transmitido até o início da aula, o equipamento grava automaticamente. Se não, o gravador busca o vídeo por uma conexão de internet. A tecnologia poderia ser usada também em casa, para o entretenimento.

BLOQUEIO E ENQUETES

Outro grupo, liderado pela Universidade de Campinas (Unicamp), desenvolveu mais uma alternativa de middleware. O sistema desenvolvido pelo consórcio permite programar a televisão para sintonizar um programa assim que ele começar. O espectador pode ver na tela informações como diretor e elenco do filme, país de origem e ano de lançamento.

O middleware da Unicamp também tem serviço de correio eletrônico na tela. "O espectador pode configurar qualquer sistema convencional de e-mail na televisão", explica Rodrigo Araújo, diretor-comercial da RCA Soft, de Campinas, empresa participante do consórcio. Outra aplicação do middleware é o registro de perfis de usuário. "Os pais podem impedir que os filhos assistam a programas que considerem impróprios."

O consórcio da Unicamp também desenvolveu um sistema de ensino a distância, onde o espectador pode responder a questionários de múltipla escolha pela televisão, enquanto assiste a programas educativos. A aplicação também poderia ser usada para entretenimento. Um programa de TV é capaz de fazer enquetes em tempo real, com as pessoas respondendo pelo controle remoto.

A interatividade e a internet na TV exigem, no entanto, um canal de retorno. Uma alternativa é o telefone fixo. Outra, o celular. Os consórcios da TV digital apresentaram mais duas opções: o WiMax, sistema de banda larga sem fio, que funciona em canal de UHF, e o CDMA450, mesma tecnologia usada pela Vivo no celular, numa faixa de freqüência diferente.

Além dos novos serviços, há uma aplicação prevista pelo SBTVD imbatível: assistir aos programas de TV com imagem de qualidade. "Na cidade de São Paulo, 56% das residências recebem imagem ruim", diz Gunnar Bedicks Jr., professor do Mackenzie. Um grupo liderado pelo Mackenzie aperfeiçoou o sistema de modulação (que protege o sinal transmitido) japonês, com uma tecnologia chamada Turbo Code. A inovação aumenta o alcance das transmissões e promete acabar com a imagem ruim.