Título: O crédito,vítima do Tesouro
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/12/2005, Economia & Negócios, p. B2

A oferta total de crédito, em relação ao PIB, não ultrapassa 30% no Brasil, muito inferior ao que se verifica em outros países. Em parte isso se explica pelo custo do crédito, reflexo da elevada taxa de juros básica (Selic), mas também pelo fato de as instituições financeiras não terem interesse em ampliar a oferta de crédito, especialmente às empresas, que pagam juro menor do que as pessoas físicas, que nos últimos anos foram as que mais contribuíram para a expansão do crédito. Esse é um fato bem conhecido, mas que acaba de ser comprovado e medido num estudo encomendado pela Federação dos Bancos (Febraban) à Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi). Das três atividades principais dos bancos - crédito, tesouraria e prestação de serviços -, os autores do estudo mostram que a primeira oferece um lucro líquido de 9%; as operações de tesouraria (essencialmente aplicação em títulos da dívida pública), margem equivalente; enquanto as prestações de serviços oferecem um lucro de 12%. É fácil entender que os bancos dêem prioridade à atividade de maior rentabilidade. Podemos, aliás, lamentar que o estudo não tivesse estabelecido uma distinção entre operações de crédito para pessoas jurídicas e físicas, que seguramente teria mostrado que no caso das pessoas físicas a margem de lucro é muito maior, especialmente no crédito consignado. O estudo, porém, nos dá um modo de avaliar isso ao indicar que o "spread" líquido nas operações com pessoas jurídicas é de 0,5%, enquanto é de 1,6% no crédito a pessoas físicas . Aliás, é interessante verificar em que se subdivide cada R$ 1 de juro que os bancos recebem dos empréstimos que fazem: 13% cobre a inadimplência, 30% vai para pagamento aos aplicadores, 10% destina-se a recursos humanos, 24% a outras despesas estruturais e 8% ao pagamento de impostos - ficando uma margem de 9%. Convém lembrar que no caso de crédito em consignação a inadimplência é praticamente nula. Nos dois outros tipos de operações não existe o problema da inadimplência. No caso da tesouraria o maior custo é a aquisição dos títulos, largamente compensado pela remuneração posterior dessas aplicações. Não podemos estranhar que os bancos tenham operações de tesouraria equivalendo ao saldo do crédito. Para aumentar a oferta de crédito, seria necessário reduzir a remuneração dos títulos públicos. Os bancos aumentaram muito, nos últimos anos, os preços dos serviços que prestam e que oferecem a maior rentabilidade. Seria o caso de favorecer uma maior concorrência entre eles, para baixar esses preços.