Título: Rural escapou de punição do BC
Autor: Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/12/2005, Nacional, p. A7

Segundo o relator Osmar Serraglio, pena de destituição de diretores foi convertida em multa de R$ 100 mil

O relator da CPI dos Correios, Osmar Serraglio (PMDB-PR), disse ontem ter sido informado, durante reunião com um diretor e quatro técnicos do Banco Central, que a direção do BC chegou a propor a destituição de diretores do Banco Rural, por causa de empréstimos irregulares feitos ao empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, mas que o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional converteu a punição em multa de R$ 100 mil. O Conselho teve entre seus integrantes o procurador da Fazenda Nacional Glênio Guedes, que recebeu, entre 2003 e 2004, R$ 1,5 milhão de Marcos Valério. Guedes também teve diárias de hotéis pagas pela agência de publicidade SMPB, de Marcos Valério. Durante a reunião, os representantes do Banco Central disseram que empréstimos do Banco Rural a Marcos Valério continuam sendo investigados e que conclusões e possíveis punições serão anunciadas em breve.

O Conselho de Recursos é a última instância de decisão quando as instituições financeiras punidas pelo Banco Central recorrem contra as punições que recebem. Glênio Guedes deixou o conselho este ano, depois que surgiu o escândalo do mensalão. Segundo Serraglio, o caso da destituição transformada em multa foi citado como exemplo por um dos representantes do BC, mostrando que a direção não tem a palavra final no caso de recursos feitos depois da fiscalização e da punição proposta.

Serraglio reuniu-se durante quase duas horas com o diretor de Liquidação e Desestatização do Banco Central, Gustavo do Vale, e diretores de departamento, para esclarecer dúvidas sobre a fiscalização do BC diante de empréstimos irregulares concedidos pelo Banco Rural às agências SMPB e Grafitti, somando quase R$ 29 milhões. Em depoimento à CPI na semana passada, o ex-superintendente do Rural Carlos Alberto Godinho disse que os empréstimos eram "de fachada" e estranhou que o Banco Central não tenha detectado os problemas quando inspecionou o Banco Rural, entre 2004 e 2005.

Vale negou qualquer omissão do Banco Central em relação aos empréstimos para Marcos Valério e revelou que algumas irregularidades estão sendo investigadas pelo BC, que em breve anunciará a conclusão da fiscalização. Segundo Vale, a preocupação principal do BC é com o banco que faz os empréstimos. Por isso, a investigação do BC se concentra em verificar se o patrimônio do banco credor é capaz de sustentar os empréstimos que a instituição concede. Questionado sobre os indícios de lavagem de dinheiro nos empréstimos, como saques de altos valores em dinheiro vivo, e não pagamento sequer das amortizações dos empréstimos, apesar de a SMPB e a Grafitti terem dinheiro em caixa, Vale afirmou que cabe aos bancos detectar os indícios e comunicar ao Banco Central.

"Não houve forma nenhuma omissão do Banco Central. Acredito que possa ter havido mal-entendidos naquela oportunidade (depoimento de Godinho)", disse Vale.