Título: Lula leva choque de realidade e mínimo pode não passar de R$ 340
Autor: Sérgio Gobetti, Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/12/2005, Nacional, p. A4

Presidente insiste que "o maior valor possível" de reajuste é a principal prioridade para fechar o orçamento

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que, na hora de fechar o Orçamento de 2006, dará prioridade absoluta ao "maior valor possível" para o reajuste do salário mínimo. Em reunião realizada no Palácio do Planalto com ministros e secretários, Lula tomou um choque de realidade sobre os custos da decisão - fator que pode levá-lo a optar por um aumento mais modesto, de R$ 300 para R$ 340, em vez de R$ 350. Depois de prometer na campanha eleitoral dobrar o poder de compra do mínimo em quatro anos de governo, Lula tenta rearranjar as finanças para conceder um reajuste maior a partir de 2006, quando deverá ser cobrado na disputa da reeleição. Mas não está fácil. Como o aumento do mínimo envolve uma das principais bandeiras das centrais sindicais, Lula só baterá o martelo sobre o valor depois de se reunir com representantes da CUT, da Força Sindical e da CGT, na próxima semana.

"O valor do mínimo será o maior que couber no Orçamento", disse o ministro do Trabalho, Luiz Marinho. "O presidente vai dar o maior reajuste que as finanças públicas permitirem", completou o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Os dois ministros participaram da reunião de ontem com Lula, ao lado de Dilma Rousseff (Casa Civil), do secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, do secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Murilo Portugal, e do deputado Carlito Merss (PT-SC), relator da Lei Orçamentária.

Cada real a mais no salário mínimo custa aos cofres federais cerca de R$ 158 milhões por ano, relativo ao valor do impacto provocado pelo aumento das aposentadorias e pensões do INSS, dos benefícios de assistência social e pelo seguro-desemprego.

Na proposta orçamentária enviada ao Congresso, o governo já incluiu uma reserva de R$ 3,35 bilhões para elevar o mínimo até R$ 321. Para chegar a um aumento maior do que esse - como R$ R$ 350, por exemplo - seria preciso um reforço orçamentário de R$ 4,66 bilhões. Mesmo assim, o presidente terminaria seu mandato com um aumento real (acima da inflação) de cerca de 33% - um terço da promessa de campanha.

ESFORÇO

"Estamos fazendo um esforço máximo para nos aproximarmos da promessa de campanha, mas temos muitas demandas para atender no Orçamento", contou Merss. Ele dispõe de R$ 16 bilhões para usar em várias despesas. Do total, R$ 5,8 bilhões já foram reservados para emendas parlamentares. Sobram R$ 10,2 bilhões para as despesas correntes, como o aumento do salário mínimo, os ressarcimentos a Estados exportadores, o reajuste dos servidores e o reforço para a área de educação e saúde.

No caso do funcionalismo, o Planejamento calcula que serão necessários R$ 5 bilhões para garantir que, até o fim do mandato, todas as categorias recebam pelo menos a reposição da inflação dos quatro anos (29%). Os governadores, por outro lado, batem pé e exigem pelo menos R$ 5,2 bilhões para cobrir as chamadas perdas com a Lei Kandir (desoneração das exportações).

O volume de demandas é tão grande que o governo praticamente desistiu de corrigir a tabela do Imposto de Renda de Pessoas Físicas. Ontem, Portugal chegou a apresentar as simulações do impacto de quatro diferentes índices de correção das faixas do IR: 5%, 10%, 12% e 13%. No caso de 10%, a renúncia de receita seria de R$ 2,2 bilhões, embora R$ 900 milhões sejam da cota do imposto que Estados e municípios recebem.

"Não vamos trocar aumento do salário mínimo por correção da tabela do Imposto de Renda", protestou ontem o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho. "Para quem prometeu na campanha dobrar o valor do mínimo, anunciar R$ 340 é ridículo. O governo terá de agüentar as conseqüências num ano eleitoral: vai ficar apanhando até não poder mais."