Título: PPPs e infra-estrutura no Brasil
Autor: Martus Tavares
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/12/2005, Espaço Aberto, p. A2

O Estado de São Paulo toma a dianteira e lança o edital da primeira operação de Parceria Público-Privada (PPP) do Brasil. Esse fato é motivo de orgulho e de esperança, mas também carrega um sentimento de frustração.

A frustração decorre de um fato que muito nos impressiona. É incrível como se perde tempo no Brasil para se formarem consensos em torno de temas relevantes para o País. Algumas vezes esse fato é visto positivamente, como foi o caso do nosso processo de redemocratização, que seguiu lento e gradual, mas sem retrocessos. Nas questões econômicas, perder tempo significa perder posições numa corrida altamente competitiva. Por exemplo, gastamos muito tempo para entender que a inflação persistente e elevada causava um mal terrível ao crescimento econômico e ampliava as desigualdades sociais do País. Levamos anos, quiçá séculos, para entender que as finanças públicas deveriam ser geridas dentro dos limites da responsabilidade fiscal.

Mas há esperança. O presidente Fernando Henrique Cardoso implementou uma reforma do Estado brasileiro que representou um avanço considerável em termos históricos. Privatizamos empresas que não tinham razão para ser de propriedade do Estado. Viabilizamos dezenas de contratos de concessão de serviços de utilidade pública. Criamos agências reguladoras e fiscalizadoras. Criamos organizações sociais. Além disso, avançamos em vários pontos das reformas previdenciária e administrativa. Por outro lado, olhando as necessidades do País em face da competição que enfrentamos, podemos dizer que aquela reforma foi tímida.

Ainda precisamos avançar nas reformas previdenciária, tributária e trabalhista. Ainda estamos longe de aprovar um novo regulamento para o setor de saneamento. Precisamos avançar nas concessões e precisamos iniciar a experiência com as PPPs. Existe um número grande de importantes projetos de infra-estrutura no País que poderiam ser empreendidos numa modalidade ou noutra.

Não por acaso, é elevada a expectativa quanto ao papel das PPPs na viabilização da expansão e melhoria da infra-estrutura no País. A experiência internacional sugere que as PPPs não podem ser vistas como panacéia para os problemas da crise financeira do Estado ou da ausência de mercado de capitais desenvolvido, mas ajuda, e muito. Nossa esperança é de que, muito proximamente, tenhamos no Brasil uma série de importantes projetos de infra-estrutura levados a efeito sob essa metodologia.

Ao final de 2004, o governo federal aprovou, com um atraso de dois anos, a legislação que impedia os avanços das administrações estaduais nessa matéria. Hoje diversos governos estaduais, como Bahia, Minas Gerais e São Paulo, já têm sua legislação específica e já constituíram seus sistemas de garantia, como fizemos em São Paulo com a criação da Companhia Paulista de Parcerias (CPP).

Neste momento, o desafio é montar uma carteira de projetos que atenda, simultaneamente, a dois objetivos: necessidades de ampliar os serviços públicos e de remunerar adequadamente os parceiros privados.

O Estado de São Paulo, por seu tamanho e sua conseqüente escala econômica, oferece dezenas de excelentes oportunidades para os investidores privados. Ao mesmo tempo, a execução de investimentos na modalidade de PPP liberará o Estado de novos compromissos financeiros e permitirá que outros projetos, com menor taxa de retorno, mas com elevado interesse público, sejam empreendidos exclusivamente com recursos do Tesouro estadual.

Dentro desse universo, demos prioridade a seis projetos que representam investimentos totais de mais de R$ 7 bilhões. Hoje estamos publicando o edital do primeiro desses projetos: Linha 4 do Metrô. Adicionalmente, já foram autorizados estudos de viabilidade econômica e de modelagem para mais cinco projetos, relativos à estação de tratamento de água de Taiaçupeba, à duplicação da Rodovia Tamoios no trecho da serra e do Porto de São Sebastião, às travessias marítimas, ao Corredor Noroeste de Campinas (ônibus) e ao complexo desportivo do Ibirapuera. Além destes, dois outros estão sendo analisados para posterior aprovação no Conselho Gestor: o Expresso Aeroporto e o trem Campinas-São Paulo.

A Linha 4 será a primeira operação de PPP do Brasil. E isso é motivo de orgulho. Estamos falando de um investimento de R$ 3,3 bilhões, sendo R$ 2,4 bilhões de responsabilidade do Tesouro estadual e R$ 0,9 bilhão do parceiro privado. Fisicamente, caberá ao Estado construir um túnel de 12,8 km, a estrutura de 11 estações e a linha do trem. O parceiro privado ficará responsável pelo acabamento das estações, pela instalação e manutenção dos sistemas de comunicação e de sinalização e pelo material rodante.

Foram feitas audiência e consulta públicas. Muitas informações foram dadas aos investidores e muitos questionamentos foram esclarecidos. Muitas sugestões foram apresentadas. Ao final, um edital com regras claras e responsabilidades bem definidas. Os principais riscos da operação estão sendo mitigados de forma criativa e inovadora, por meio de cláusulas contratuais e seguro a ser contratado com a CPP.

Vários dispositivos asseguram a regularidade e a qualidade dos serviços a serem prestados pelo concessionário privado. É importante destacar que o atual sistema de gratuidade será inteiramente estendido à nova linha e constituirá ônus do Tesouro estadual.

Estamos certos de que essa operação abrirá o caminho para a viabilização de vários outros projetos de infra-estrutura no Estado de São Paulo e no Brasil, consagrando a metodologia de PPP no País.