Título: 'Lula está abalado', avalia especialista
Autor: Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/01/2006, Nacional, p. A5

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vive uma situação delicadíssima em relação às próximas eleições. Na opinião do cientista político Marcus Figueiredo, do Instituto de Pesquisas Universitárias do Rio de Janeiro (Iuperj), isso ficou claro mais uma vez na entrevista que ele deu ao Fantástico, da TV Globo, no domingo á noite, quando disse que ainda não sabe se será candidato à reeleição. "Pelo modo como falou, não acredito que esteja fazendo charme político", diz o estudioso. "Lula está visivelmente abalado." O que faz Lula titubear, segundo Figueiredo, é o fato de saber que não basta ganhar a eleição: "Em outras ocasiões ele já chamou a atenção sobre a dificuldade de governar sem uma sólida base de apoio no Congresso. No momento, a expectativa de conseguir esse apoio, no caso de uma eventual vitória, é mínima. O PT está desgastado e deverá ser punido pelo eleitorado. Os aliados de última hora, como o PTB e o PL, não estão nem nos planos das alianças, porque também ficaram comprometidos com os escândalos. O PMDB permanece na tradicional indefinição."

Num segundo mandato, Lula certamente teria o apoio do PC do B e do PSB, aliados tradicionais e fiéis. Mas isso não bastaria. "São partidos pequenos e sem forças para a montagem de uma base parlamentar minimamente suficiente para garantir o governo."

O dilema de Lula é agravado, segundo o estudioso, pelo fato de ser difícil explicar para a opinião pública a desistência de um segundo mandato. "Terá que dar uma explicação muito boa. Se não convencer, será como assumir um fracasso. Nesse caso cairá no ostracismo."

O cientista político diz que o presidente se esforçou durante a entrevista ao Fantástico para parecer sincero e evitar expressões meramente burocráticas. "Quando disse que foi traído pelo PT, apunhalado pelas costas, ele procurou demonstrar que estava realmente indignado e decepcionado."

O que assusta Lula, segundo Figueiredo, é a situação precária do PT, cuja recuperação vai demorar um bom tempo, e a possibilidade de se tornar refém de outros partidos: "É duro concorrer sabendo que, se ganhar, ficará nas mãos dos outros."