Título: BB deu aval a operação fictícia
Autor: Dora Kramer
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/12/2005, Nacional, p. A6

A CPI dos Correios fará hoje mais que uma mera prestação de contas para organizar e consolidar o produto de sete meses de trabalho. Haverá novidades, tendo ao centro da cena de malfeitorias o Banco do Brasil. Os parlamentares responsáveis pelas investigações não entram em muitos detalhes para não estragar o impacto de logo mais. Sabe-se, porém, que a comissão demonstrará, com novos detalhes e maior precisão, as irregularidades nos acertos do BB com a Visanet e revelará que dois contratos do banco serviram como garantia para os empréstimos fictícios feitos por Marcos Valério junto ao Banco Rural em nome do PT.

O relator Osmar Serraglio, que fará a apresentação dos documentos, é um pouco mais contido na avaliação sobre o envolvimento do banco. Mas o sub-relator Eduardo Paes traduz o sentimento vigente na CPI, segundo o qual diversas repartições oficiais, como Receita Federal e Polícia Federal, forem resistentes na colaboração com a comissão sendo que, no caso do Banco do Brasil houve mais do que simples resistência.

¿Não tenho dúvida em afirmar que existiu uma tentativa deliberada de desmoralizar a CPI¿, diz Eduardo Paes, citando entre os vários exemplos dados errados encaminhados à comissão com o intuito de provocar desmentidos desmoralizantes.

Um deles, descoberto pela CPI a tempo de suspender a divulgação, foi uma listagem na qual os nomes de José Genoino, José Dirceu e Roberto Jefferson apareciam como beneficiários de depósitos de empresas privadas e associações de classe.

Se divulgado, o caso seria um escândalo. Mas, como a informação era falsa, o tiro sairia pela culatra e a CPI seria acusada de precipitação, descuido e denuncismo irresponsável. Diante da cobrança da CPI a respeito do que Paes qualifica como ¿armadilha¿, o Banco do Brasil atribuiu o ¿erro¿ a um trabalho equivocado de estagiários.

O mesmo ocorreu com um suposto depósito na conta de Delúbio Soares por parte do empresário mandante das gravações originais nos Correios que resultaram no flagrante de propina cobrada por Maurício Marinho. Aí também o BB alegou a ocorrência de equívoco operacional. O último relatório do Banco do Brasil enviado à CPI com dados sobre a auditoria interna também apresenta informações embaralhadas que ainda precisam ser decifradas pela CPI. Hoje provavelmente não estarão ainda prontas para divulgação.

Mas a comissão já tem informações suficientes para firmar a convicção de que o Banco do Brasil foi, pelo investigado até agora, a maior fonte de abastecimento das contas de Marcos Valério.

A decisão de divulgar uma prestação de contas apresentada pelo relator foi tomada a partir da constatação de deputados e senadores de que a CPI está correndo sério risco de perder a batalha da comunicação para os desmentidos sucessivos que, mediante meras negativas, buscam apresentar os resultados das investigações como versões inventadas a partir de suposições sem comprovação.

¿Vivemos uma situação absurda em que as descobertas da CPI vão sendo invalidadas pela repetição exaustiva de chavões tais como o de que o mensalão não existiu¿, aponta o relator Osmar Serraglio.

Por isso mesmo, na prestação de contas de hoje a CPI apresentará novos dados ¿ ontem ainda dependentes do cruzamento de nomes de funcionários da Câmara e sacadores das contas de Marcos Valério ¿ para comprovar que, independentemente da periodicidade (semanal, mensal, diária, bimestral, etc.), havia um caixa disponível para atender às necessidades financeiras de ¿três ou quatro partidos¿ da base aliada ao governo. A saber, PT, PTB, PL e PP.

¿Mensalão foi uma marca de fantasia inventada com competência pelo Roberto Jefferson e, com a mais deslavada desfaçatez, negada pelo governo¿, diz Eduardo Paes.

Com base na demonstração da existência de uma, digamos, linha de crédito a fundo perdido permanentemente aberta para o uso dos aliados, a CPI pretende combater a versão sobre o caixa 2. Não que não tenha havido financiamento de campanhas, ¿mas a agenda dos saques mostra que eles foram em sua maioria feitos longe do período eleitoral¿.

Quanto aos empréstimos ¿ negados início da crise e logo depois transformados em ¿provas¿ da legalidade das operações financeiras do PT ¿, mais uma vez a CPI os mostrará como obras de ficção. Mediante três provas: ausência de cobrança e pagamento; inexistência de registros na contabilidade das empresas de Valério à época em que teriam sido contraídos; e justificativas contábeis para transações feitas há mais de três anos com base em legislação em vigor há apenas dois.

Linha reta

Se é mesmo sincera a constatação tucana de que a reeleição não deu certo, uma prova de franqueza seria a orientação a seus governadores de primeiro mandato para desistirem de disputar um segundo tempo.