Título: Surto de maculosa prejudica fim de ano em Itaipava
Autor: Roberta Pennafort, Pilar Magnavita
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/12/2005, Vida&, p. A26
Movimento turístico na cidade na região serrana do Rio caiu 20% depois que surgiram casos da doença
Às vésperas das festas de fim de ano, o distrito de Itaipava, em Petrópolis, na Região Serrana do Rio, tradicionalmente procurado por famílias que buscam tranqüilidade nessa época, ainda sofre com o fantasma da febre maculosa. A região, a 75 quilômetros da capital, teve um surto da doença entre outubro e novembro e duas pessoas morreram. Assustados, veranistas e turistas se mantêm distantes - e o movimento caiu 20%. As pousadas, que há um bom tempo deveriam estar com as reservas esgotadas, tentam atrair os hóspedes com diárias, em média, 20% mais baratas. Mas têm encontrado dificuldade de convencer os visitantes a retornar e já tiveram de cortar funcionários (em alguns casos, 30% do pessoal foi dispensado).
Os comerciantes também estão no prejuízo. Das 102 lojas do shopping Vilarejo, o maior de Itaipava, 10 fecharam nos últimos 30 dias e outras estão prestes a seguir o mesmo caminho pela falta de consumidores.
"O movimento caiu 30%. É o pior momento do shopping. Esperamos que melhore em janeiro, mas o Natal já perdemos", disse o administrador, Carlos Grijó, que está lá desde a inauguração, há 12 anos. Com a chegada do verão, o shopping aposta na recuperação. Em janeiro, haverá um festival de música para atrair os clientes.
MÁ FAMA
Na Pousada Capim Limão, uma das mais charmosas de Itaipava, o tempo também é de recomeçar. Os hóspedes desapareceram depois que quatro adoeceram, em outubro, dias após fazer uma caminhada por uma trilha que fica na parte dos fundos.
Eles foram infectados por carrapatos-estrela, transmissores do microorganismo Rickettsia rickettsii, que causa a febre maculosa. Dois morreram: o superintendente da Vigilância Sanitária do Rio, Fernando Villas Boas Filho, de 41 anos, e o jornalista Roberto Moura, de 58. Com isso, a pousada ficou fechada por 15 dias.
"Todo réveillon temos 100% dos quartos ocupados, mas neste ano teremos apenas 50%", lamenta o subgerente, Estevão Domingos dos Santos. Na tentativa de recuperar o movimento, a pousada prepara mudanças no cardápio do restaurante e reformas. Santos acredita que as pessoas que planejavam passar a virada do ano em Itaipava, para fugir da agitação da capital, decidiram ir para outros pontos do Estado, como a Região dos Lagos.
"Levamos a fama sem que houvesse comprovação de que os carrapatos encontrados aqui estavam infectados", reclama. A Capim Limão teve de dispensar três funcionários que haviam sido contratados justamente para reforçar a equipe de fim de ano.
A Pousada Quinta do Jade também sentiu forte queda na ocupação. Teve de diminuir os custos e já cortou a ceia de ano-novo que ocorre há três anos, com queima de fogos e música ao vivo. O gerente, que é sobrinho dos proprietários, contou que a própria família está com medo de ir para lá. "O meu sobrinho-neto chegou a dizer para o pai: 'Papai, não vá lá porque tem carrapato que morde e você morre.' Temos de esperar para ver se sai esse mito da cabeça das pessoas."
ALERTA
Para a Secretaria Estadual de Saúde, que registrou 11 casos de maculosa neste ano, 5 na região de Itaipava, o alerta foi dado. Além das duas mortes na serra, houve duas no interior. Como ninguém mais ficou doente e as áreas com carrapato foram isoladas , não há mais risco iminente (os bichos não resistem às chuvas). O diretor do Centro de Vigilância Epidemiológica do Estado, Aloysio de Araújo Ribeiro Neto, disse que as mortes foram conseqüência da falta de um diagnóstico rápido da doença - apesar de ela não ser desconhecida das autoridades de saúde.
Ele explicou que, de 1980 a 2005, foram registrados 23 casos de febre maculosa no Estado e o fato de neste ano ter havido mais ocorrências se deve ao aumento da notificação. Nesta semana, Ribeiro se reuniu com representantes dos 19 municípios onde o mal foi verificado para delinear uma política de monitoramento contínuo a partir de 2006. Uma resolução instituiu que áreas de lazer que possam ser foco de carrapatos tenham placas avisando sobre o risco de contaminação.
"Esses casos não podem cair no esquecimento. Temos de nos preparar e não sermos pegos de surpresa", afirmou. Os meses mais secos, junho e julho, são críticos, porque é a época em que o carrapato se prolifera.
Ribeiro lembrou que não é possível exterminar o inseto das áreas de mata, até porque só 1% deles contrai o microorganismo, presente na natureza.