Título: O Brasil na lanterna
Autor: Suely Caldas
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/12/2005, Economia & Negócios, p. B2

Ano de prosperidade econômica no mundo inteiro, 2005 foi ruim para o Brasil. É triste ver nosso país exibir a humilhante posição de lanterninha entre os países da América Latina, com maior crescimento econômico, em levantamento feito pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), divulgado na quinta-feira. Nas duas regiões, nada menos que 25 países se situam à frente do Brasil, com taxas de crescimento do produto interno bruto que variam entre 9% e 2,8%. Países com dinamismo e dimensão econômica muito mais pobre que o nosso, como Peru, Bolívia, Nicarágua e Guatemala, souberam tirar proveito dos bons ventos que sopraram no planeta este ano. Nós, não, vamos acabar o ano rastejando na taxa medíocre de 2,5%, à frente apenas de El Salvador, Haiti, Jamaica e Guiana, constata a Cepal. O governo Lula não priorizou o investimento público e tampouco cuidou de construir arcabouço para dinamizar o investimento privado. Ao contrário, em 2003 avisou que mudaria marcos regulatórios instituídos no governo FHC, criando clima de insegurança e incerteza que levou investidores em infra-estrutura a recuar, adiar projetos ou até a mudar de país. Hoje pagamos pelo impulso infantil e insensato, porque o governo aprendeu tarde demais que decisões de investimento em serviços de concessão pública ¿ portos, estradas, usinas, ferrovias, etc. ¿ exigem regras bem explicitadas, estáveis, duradouras, e que mudanças no meio do caminho só assustam e afugentam o investidor privado. A politização das agências reguladoras, que passaram a ser dirigidas por políticos sem preparo técnico para a função, também contribuiu para piorar o cenário.

Por puro e infantil preconceito ideológico, o governo substituiu as privatizações pelas Parcerias Público-Privadas, as famosas PPPs, que não saíram do papel nem dos gabinetes ministeriais, em Brasília. Outro atraso nasceu da crise política decorrente de atos de corrupção do PT e do governo, que tomaram conta do Congresso: os parlamentares pararam de aprovar leis, o presidente Lula atrapalhou-se na administração da crise e as reformas ¿ tão importantes para estimular investimentos ¿ não andaram, estão perdidas no Parlamento ou paradas na burocracia governamental.

Na semana passada o Banco Mundial divulgou um receituário de medidas para criar ambiente propício ao investimento no Brasil, onde considera imprescindível a reforma na legislação trabalhista. Aí está um tema em que o governo Lula tinha tudo para ganhar de goleada, não só porque o PT nasceu no movimento sindical, mas também porque Lula e companheiros sindicalistas propõem mudanças desde os tempos do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, no final dos anos 70. Na época, o conjunto de propostas tinha o objetivo central de desatrelar os sindicatos da proteção e do controle do Estado. A independência começava pela sustentação financeira dos sindicatos, que passariam a viver das contribuições dos associados, e não mais do Imposto Sindical, recolhido e distribuído pelo Ministério do Trabalho e que desde os tempos de Getúlio Vargas foi usado politicamente para manter os sindicatos dependentes do governo.

Pois bem, ao chegar ao poder Lula fez tudo diferente. Sua proposta de reforma sindical, que está no Congresso, não suprimiu o imposto e ainda incorporou como beneficiárias dele as centrais sindicais. E mais: também não eliminou a prática de a CUT, a Força Sindical e a CGT serem aquinhoadas com verbas públicas de programas do Ministério do Trabalho, cuja aplicação não é fiscalizada por ninguém. A proposta de independência e autonomia foi para o brejo. A reforma nas leis trabalhistas nem projeto tem e não há esperança de ser enviada ao Congresso até o final do governo. E ela é vital não apenas para atrair investimentos, mas sobretudo para tirar da informalidade milhões de trabalhadores que não têm garantido nenhum direito trabalhista.