Título: A caravana passa
Autor: Celso Ming
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/12/2005, Economia & Negócios, p. B2

A inflação (custo de vida) deste ano deve ficar mais perto dos 6% do que dos 5% e isso diz mais do que parece.

A evolução do IPCA em novembro, ontem divulgada pelo IBGE, ficou em 0,55%, dentro do que se esperava. É um número mais baixo do que o de outubro (0,75%) e reforça a percepção de que a cavalgada está perdendo força.

A inflação acumulada em 2005 até novembro já é de 5,3% e, em 12 meses (novembro a novembro), de 6,2%. Bastará que dezembro traga um IPCA ligeiramente acima de 0,5% para que o ano aponte para inflação entre 5,8% e 6,0%. Por aí já dá para ver que o sacrifício deste ano só conseguiu baixar a inflação dos 7,6%, verificados no ano passado, para os prováveis 5,9% deste ano, o que não é pouco.

Do ponto de vista estritamente técnico, essas considerações dão razão ao Banco Central quando sustenta que, se é para cumprir a meta deste ano, de uma inflação não superior a 5,1%, os juros não poderiam ter ficado abaixo do que estiveram.

É claro que isso não mata o assunto. É preciso perguntar se a sociedade está disposta a aturar o arrocho monetário e a suportar um crescimento econômico medíocre para ter inflação mais baixa. O tiroteio contra o Banco Central e sua política de juros, depois que o País soube do tamanho do PIB do terceiro trimestre, pareceu indicar que a sociedade está clamando por afrouxamento.

Mas as pessoas são volúveis. Basta que a inflação saia do caminho da roça para que os mesmos que hoje gritam por mais crescimento peçam mão pesada contra a deterioração do poder aquisitivo do consumidor.

Por enquanto, a inflação não está saindo do caminho da roça. Quem olha para frente vê que em 2006 o combate à inflação será mais fácil do que foi em 2005 e que a meta de 4,5% não está fora de propósito.

Dois fatores decisivos concorrem para isso. O primeiro é o dólar barato. Apesar da reação dos últimos dois dias, nada indica disparada altista do dólar que concorresse para elevar os preços em reais dos produtos importados. Ao contrário, as projeções apontam para um superávit comercial (exportações menos importações) em 2006 perto dos US$ 36 bilhões.

O segundo fator, que deverá manter a inflação sob controle é o baixo reajuste esperado nos preços administrados. Eles pesam cerca de 30% no IPCA (inflação oficial) e não são atingidos pela alta dos juros. Na categoria estão insumos, mercadorias e serviços (energia elétrica, tarifas telefônicas e aluguéis), cujos valores são corrigidos, pela lei ou por contrato, pelo IGP-M, Índice Geral de Preços do Mercado.

Neste ano, o IGP-M terá uma variação próxima de 1,5%. Ao contrário do que aconteceu em anos anteriores, daqui para frente o IGP-M conduzirá a reajustes dos preços administrados bem abaixo da inflação e, nessas condições, jogará a favor da inflação descendente.

De qualquer forma, a inflação deste ano mais perto dos 6% reforça apostas de que a próxima reunião do Copom, agendada para terça e quarta-feira, seguirá no ritmo atual, de corte comedido dos juros, de 0,5 ponto porcentual por vez. A reação dentro e fora do governo a esse passo de dança será o coro indignado de sempre. E o Banco Central ouvirá tudo com a cabeça de quem pensa num velho ditado. "A caravana passa", dirá Henrique Meirelles. E será assim enquanto o presidente Lula bancar o jogo do Banco Central.

E, cá entre nós, quem disse há alguns dias, que providenciaria "um ajuste na política econômica" que sairia ainda na semana passada e depois não fez nada, não pretende desbancar o jogo do Banco Central.