Título: UE atribui endurecimento do Brasil à crise
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/12/2005, Economia & Negócios, p. B1

O comissário de Comércio da União Européia (UE), Peter Mandelson, afirmou aos 25 Estados membros do bloco europeu que o endurecimento da posição adotada pelo Brasil nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) se deve em parte à crise política que vive o País diante dos escândalos de corrupção. Numa reunião a portas fechadas com os ministros dos países que fazem parte da UE, o comissário relatou como estão as negociações nos últimos dias e tentou explicar por que um acordo com os demais países emergentes, principalmente com o Brasil, não consegue ser fechado. "A máscara do Brasil está caindo", afirmou a ministra de Comércio da França, Christine Lagarde, que há poucos dias afirmou que o Brasil estava querendo deixar a Europa nua.

Como ocorre todos os dias desde o inicio das negociações em Hong Kong, os 25 países da UE se reuniram ontem com Mandelson para que o comissário explique o que está ocorrendo nas salas de negociação. Na OMC, os 25 países do bloco falam com uma só voz e são representados por um negociador. Mas, em Hong Kong, estão vigiando cada passo de Mandelson.

Os franceses, espanhóis e italianos não querem que a UE faça nenhum tipo de concessões na área agrícola, ainda que pelo menos quatro países do bloco - Suécia, Dinamarca, República Tcheca e Holanda - já tenham indicado que estão dispostos a flexibilizar suas posições.

"Não vamos aceitar fazer uma concessão unilateral, como o estabelecimento de uma data para o fim dos subsídios à exportação", afirmou Lagarde, que esteve na reunião com Mandelson.

"As máscaras caem. Quanto mais o Brasil pede em agricultura, menos está disposto a aceitar abrir seu mercado para os produtos industriais e serviços. Ainda não há uma proposta brasileira na mesa sobre o corte de tarifas para o setor de manufaturados. Por isso, avaliamos que há um claro retrocesso", afirmou a ministra. "O Brasil nos acusou por dias por causa de nossa oferta agrícola. Mas, quando vemos de perto a posição brasileira, fica claro que o País é defensivo em temas como produtos industriais e serviços. A diferença é que nós, europeus, chegamos a Hong Kong sem máscaras."

Um alto funcionário do governo espanhol relatou ao Estado que, ao explicar o endurecimento aparente da posição brasileira, Mandelson afirmou que isso se devia em parte à lógica da crise política no País.

O comissário insinuou que o Brasil estaria precisando mostrar resultados positivos no exterior ao defender suas posições e não abrir mão unilateralmente de questões sensíveis, como o corte de tarifas para importações. Ao final do encontro, 20 dos 25 países da UE mantiveram as instruções a Mandelson para que não aceite fazer concessões aos países em desenvolvimento.