Título: No mundo árabe, festa e apreensão
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/01/2006, Internacional, p. A10

Muitos no mundo árabe desprezam o primeiro-ministro Ariel Sharon e o responsabilizam pela crise recente no Oriente Médio. Alguns lhe dão crédito pela retirada israelense da Faixa de Gaza. A maioria expressa pouca esperança de que sua saída do poder ponha fim a mais de meio século de conflito. Em geral, os palestinos e o mundo árabe acompanharam, com alegria e uma certa apreensão, o noticiário sobre a situação de Sharon, a quem costumam referir-se como "criminoso", "buldôzer" e "açougueiro". Não foram os únicos a celebrar. Um grupo de ultranacionalistas judeus israelenses, irados com a decisão de Sharon de entregar a Faixa de Gaza aos palestinos, também comemorou.

Na comunidade internacional, em geral, as reações foram de pesar e solidariedade com Israel. Líderes dos EUA, Itália, França, Brasil e Japão, entre outros, lamentaram a doença e a reviravolta que provocará na região. O presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, telefonou para o governo de Israel para desejar "uma rápida recuperação". "Acompanhamos com grande preocupação o que pode acontecer se ele não se recuperar", disse Abbas.

"Isto é muito triste, tanto no nível humano como no político. Há muito, muito pouca esperança. Vamos esperar por um milagre que seria extraordinariamente importante", declarou o primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi. O presidente francês, Jacques Chirac, disse esperar que Sharon supere esse teste "doloroso" enquanto o maior aliado de Sharon, o presidente dos EUA, George W. Bush, definiu-o como "um homem de coragem e paz", e disse que "todos estão rezando por sua recuperação" (ler abaixo).

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou ontem uma mensagem ao primeiro-ministro interino de Israel, Ehud Olmert, transmitindo votos de recuperação de Sharon. Na mensagem, o presidente brasileiro destacou a atuação de Sharon nos esforços de paz no Oriente Médio.

Nas ruas das cidades e campos de refugiados da Faixa de Gaza e da Cisjordânia, radicais festejaram ostentando suas armas e alguns grupos distribuíram doces para a população, que demonstrava alegria com as notícias. As TVs árabes estão travando uma dura competição pela mais completa cobertura sobre a enfermidade de Sharon. Duas emissoras , a libanesa TV do Futuro e a Al-Arabiya, de Dubai, chegaram a noticiar que ele havia morrido, para depois voltar atrás e repetir os boletins médicos do hospital.

Apesar de Sharon ser amplamente desprezado pelo público árabe, a cobertura da imprensa foi comedida e incluiu analistas elogiando a decisão de Sharon em relação à Gaza. "Não há outro político além de Sharon que possa implementar a paz", disse Labib Kamhawi, um analista político jordaniano.

Para a encarregada de negócios da Delegação Especial da Palestina no Brasil, Hala Fariz, o fato de Sharon ter realizado a retirada unilateral da Faixa de Gaza não significa que ele seja um aliado dos interesses palestinos. "Sharon concluiu que deveria tomar alguns passos unilaterais por ver que a situação chegou a um ponto desfavorável para os interesses de Israel, mas não assumiu um processo de negociação sério de paz, que na verdade ficou paralisado", avaliou Hala ao Estado.

A embaixadora de Israel no Brasil, Tzipora Rimon, disse que acompanha com grande atenção e esperança a situação de Sharon. "Vamos esperar. Israel tem instituições políticas fortes. Os ministérios e o governo mantêm suas atividades. Os preparativos para as eleições de 28 de março continuam", disse Tzipora Rimon ao Estado. "Esse é um processo natural, apesar da preocupação com Sharon. Cada capítulo da vida dele acompanha a história do Estado de Israel."