Título: Morales nacionalizará gás por decreto
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Fonte: O Estado de São Paulo, 22/12/2005, Internacional, p. A14

Vice do presidente eleito anuncia que a medida já está sendo preparada e terá como base a lei de hidrocarbonetos

O futuro governo do presidente eleito boliviano, o socialista Evo Morales, nacionalizará por decreto a propriedade do gás natural na boca do poço, atualmente nas mãos de petrolíferas estrangeiras, anunciou ontem o vice-presidente eleito Álvaro García. ¿Será por decreto, não mediante lei¿, ressaltou García, um dos mais próximos colaboradores do líder indígena ¿ que venceu por ampla margem a eleição presidencial de domingo e assumirá o poder em 22 de janeiro. Morales cumprirá assim, com caráter de urgência, sua promessa eleitoral de nacionalizar os hidrocarbonetos (petróleo e gás), como parte de uma política de recuperação da propriedade estatal sobre todos os recursos naturais, acrescentou García a jornalistas.

O vice de Morales, que falou com a imprensa ao fim de uma reunião de seu partido, o Movimento ao Socialismo (MAS), disse que o decreto já está sendo preparado e refletirá as disposições de uma lei sobre o setor que entrou oficialmente em vigor em maio, mas ainda não foi posta em prática.

A nova lei, além de aumentar os impostos sobre a exploração de gás e petróleo, declara de propriedade do Estado boliviano os hidrocarbonetos explorados ou por explorar. O atual governo, entretanto, ainda está negociando com as petrolíferas as modificações nos contratos para adaptá-los à lei.

Antes do anúncio de García, a Câmara Boliviana de Hidrocarbonetos (CBH) já manifestara preocupação com a perspectiva de nacionalização do gás. Numa nota, a CBH assinalou que as empresas petrolíferas internacionais instaladas na Bolívia dificilmente farão novos investimentos. ¿Investir já é complicado, e muito mais se as condições de segurança jurídica que o Estado pode oferecer neste momento são exíguas¿, destacara a entidade.

A preocupação da CBH coincidiu com um pedido do porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da França, Jean-Baptiste Mattei, a Morales para que garanta um ¿ambiente jurídico estável¿ para as empresas estrangeiras.

Morales, que apuradas ontem 78% das urnas tinha 54% dos votos, reiterou que pretende fazer uma revisão em todos os contratos de exploração de gás natural e petróleo.

Por sua vez, o governo espanhol negou categoricamente ter feito acordo com Morales para dobrar a ajuda econômica espanhola à Bolívia. Um porta-voz do governo aproveitou a chance para pedir desculpas a Morales por um trote aplicado ao presidente eleito por uma rádio espanhola, a rede Cope. Protagonistas de um programa humorístico telefonaram para Morales.

Um deles, fazendo-se passar pelo primeiro-ministro espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, cumprimentou o presidente eleito pela vitória e o convidou a visitar a Espanha. Pouco depois, Morales anunciava publicamente as felicitações e o convite recebidos supostamente do governo espanhol, causando constrangimento a Zapatero. O governo boliviano convocou o embaixador espanhol para comunicar seu protesto.