Título: Deputados culpam imprensa por desgaste
Autor: Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/01/2006, Nacional, p. A5

Depois de vinte dias, os deputados do Conselho de Ética da Câmara voltaram do recesso inconformados com a péssima repercussão que provocou o período de descanso dentro da convocação extraordinária. Voltaram-se contra a imprensa, com reclamações para todos os lados e juras de que, mesmo longe de Brasília, não deixaram de trabalhar. "O conselho foi o vilão da convocação, absurda nos gastos, bizarra na forma e pretensiosa na pauta. Nós ficamos como gazeteiros. Estou com tanta ira santa, que vou caprichar ainda mais no meu relatório", disse o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), que na próxima quinta-feira apresentará o parecer do processo de cassação da mandato de Wanderval Santos (PL-SP).

"O conselho virou a Geni. A convocação assombra, perambula como se fosse um zumbi acompanhado da mula sem cabeça", reclamou Edmar Moreira (PFL-MG), relator do caso do petista José Mentor (SP). "Não deixamos de trabalhar nem um minuto", reforçou o presidente do conselho, Ricardo Izar (PTB-SP), que não aceitou o termo usado por Chico Alencar. "Não é verdade que o conselho foi o vilão da convocação. Só esta semana vamos encerrar quatro processos", garantiu Izar. O petebista Nelson Marquezelli (SP) registrou seu protesto: "É impressionante como a Câmara, diferente do Senado, fica, ano a ano, mais submissa à imprensa."

Marcelo Ortiz (PV-SP) era outro revoltado. "O Judiciário vai receber R$ 24.500, enquanto nós continuaremos apenas com os R$ 12 mil. E ninguém acredita que recebemos R$ 9.100 líquidos por mês", fez as contas. "Vamos arrumar outro bode expiatório que não seja o Conselho de Ética", desabafou.

Depois da imprensa, as baterias voltaram-se contra os presidentes da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP) e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), embora seus nomes não tenham sido citados. Izar disse que pediu convocação extraordinária a partir da primeira semana de janeiro, e não de 16 de dezembro. "A convocação foi feita da maneira que não podia. O conselho depende do plenário, porque os prazos são contados por sessões ordinárias", lembrou.

Depois das queixas, os parlamentares aprovaram requerimento do deputado Júlio Delgado (PSB-MG) que pediu à Câmara que o primeiro projeto a ser votado, quando forem retomados os trabalhos legislativos, na semana que vem, seja o que extingue o pagamento de um salário extra aos parlamentares, em períodos de convocação extraordinária. "Devolver o dinheiro para uma instituição de caridade na base eleitoral do deputado é demagogia", disse Delgado.

NOVA IMAGEM

A inversão da pauta de votação, no entanto, cabe ao Conselho de Líderes. Os integrantes do Conselho de Ética pretendem sensibilizá-los para que, com o fim do pagamento extra, comece a recuperação da imagem do Legislativo. Dos 63 deputados que abriram mão dos dois salários pela convocação extra (cerca de R$ 25,44 brutos e R$ 18,5 mil, líquidos) do Congresso, 34 decidiram não devolver o dinheiro, mas destiná-lo a entidades de suas bases eleitorais. Assim, com o dinheiro público de uma convocação que só vale de fato a partir do dia 16, deram início à campanha pela própria reeleição.

Com a retomada dos trabalhos no Conselho de Ética, o deputado Pedro Corrêa (PP-PE) é o próximo nome na lista de 11 a serem julgados. Embora o relator Carlos Sampaio (PSDB-SP) não revele sua conclusão, é certo que será pedida a punição máxima ao presidente do PP, que, segundo o empresário Marcos Valério de Souza, teria recebido R$ 4,1 milhões do esquema de caixa 2. O relatório de Sampaio será entregue na quinta-feira. Na quinta e na sexta serão concluídos ainda os relatórios dos processos de Professor Luizinho (PT-SP), Roberto Brant (PFL-MG) e Wanderval Santos (PL-SP).

Apesar de haver outros depoimentos na semana que vem, Izar quer pôr em votação no conselho os quatro processos. Mas o mais provável é que eles sejam votados somente na semana seguinte.