Título: Brasil manterá comando de força
Autor: Denise Chrispim Marin e Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/01/2006, Internacional, p. A10

BRASÍLIA - O governo brasileiro obteve ontem o apoio do grupo de países envolvidos na pacificação e reestruturação do Haiti e permanecerá no comando das operações militares da ONU no país caribenho. ¿O Brasil se comprometeu intensamente com o Haiti e certamente acolheremos com satisfação outro brasileiro para comandar a força¿, destacou em Nova York o subsecretário-geral da ONU para Operações de Paz, Jean-Marie Guehenno. Com a decisão, o Brasil livrou-se do pesado custo político e da possível desmoralização que a perda desse posto traria para o País, justamente no momento em que reacende sua campanha por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança.

Ainda na tarde de ontem, o governo submeteu à ONU a sua indicação do general de divisão José Elito Carvalho Siqueira, comandante da 6.ª Região Militar (ler ao lado), para substituir o general Urano Teixeira da Matta Bacellar, encontrado morto no sábado com um tiro na cabeça. A indicação ainda precisa ser formalmente aprovada pela ONU.

A negociação foi realizada durante uma conferência por telefone, ontem, entre o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), o chileno José Miguel Insulza, o chefe político da Missão das Nações Unidas de Estabilização no Haiti (Minustah), o também chileno Juan Gabriel Valdés, e representantes dos governos da França, dos EUA, da Argentina e do Chile. Somados ao Brasil, esses países formam o chamado Core Group para o Haiti.

No sábado, logo depois da notícia da morte do general Urano, Amorim havia conversado sobre o assunto com o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, o chanceler chileno, Ignacio Walker, e o próprio Valdés.

Em 2004, o Brasil assumiu o comando das operações militares da Minustah por ter contribuído inicialmente com o maior contingente militar. Atualmente, o maior contingente é o da Jordânia, com 1.500 homens, seguido pelo brasileiro, com 1.213. Como a Jordânia não teria manifestado, após a morte do general Urano, interesse em assumir o comando, o caminho ficou livre para o Brasil.

Para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a manutenção dessa posição de destaque e de risco tem igualmente motivações diplomáticas. Além do vínculo dessa missão com a ambição brasileira por um assento permanente no Conselho de Segurança, a recuperação do Haiti tornou-se uma das principais campanhas do presidente em suas investidas no exterior, especialmente em foros multilaterais.

Segundo a assessoria do Itamaraty, as discussões sobre o tema prosseguirão nesta semana. Depois de passar pelo Haiti, com a missão de levantar o moral das tropas brasileiras, o comandante do Exército, general Francisco Albuquerque, seguirá para Nova York para tratar na ONU das operações militares.

Ontem, durante a conferência, o Core Group deu também seu firme apoio à realização das eleições legislativas e presidenciais no Haiti no dia 7 de fevereiro. Também rejeitou a possibilidade de que ¿provocações¿ e ¿pretextos¿ possam atrasar novamente ou impedir a realização da votação e condenou as ações violentas e o que chamou de campanha em curso para desmoralizar o trabalho da Minustah.

Com essas declarações, os cinco países ¿ entre eles, EUA e França, membros permanentes do Conselho de Segurança ¿ definiram claramente um prazo para o governo interino do Haiti concluir a distribuição de títulos de eleitor e a contratação de fiscais. Marcadas inicialmente para novembro, as eleições foram sucessivamente adiadas pelo comitê eleitoral por falta de garantias de uma votação confiável.