Título: Ministério deve R$ 52 mi para SP
Autor: Chico Siqueira
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/12/2005, Vida&, p. A11

O valor não foi repassado em dezembro ao Estado; R$ 35 mi seriam aplicados em serviços de hemodiálise

O Ministério da Saúde deixou de enviar R$ 52 milhões aos hospitais de São Paulo em dezembro. Mais da metade do valor seria destinada ao tratamento de pacientes com problemas renais crônicos. O atraso está dificultando o atendimento aos pacientes que necessitam de hemodiálise e tornando mais caro o serviço prestado pelos estabelecimentos de saúde, que têm sido obrigados a fazer empréstimos para não suspender o atendimento de emergência. A hemodiálise é um tratamento de remoção de substâncias tóxicas e do excesso de líquido acumulado no sangue e tecidos do corpo de portadores de problemas renais crônicos. O sangue do doente passa por um filtro que retira as toxinas e volta depurado ao organismo. A falta de hemodiálise, realizada normalmente três vezes por semana, pode acarretar várias complicações cardiovasculares e sanguíneas, levando à morte.

A maior fatia dos recursos federais destinados a São Paulo que não foram pagos, R$ 35 milhões (66%), seria utilizada exclusivamente para o tratamento de pacientes atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) por meio do Programa de Terapia Renal Substitutiva, como boa parte dos hemofílicos. Até outubro, havia quase 8 mil pacientes na fila de São Paulo à espera de um transplante de rim, o que significa que são doentes crônicos submetidos regularmente a sessões de hemodiálise.

Os outros R$ 17 milhões da verba atrasada para o Estado serviriam para pagar serviços prestados pelos hospitais-referência do programa Integra SUS, uma espécie de prêmio para os que conseguem maior eficiência no atendimento pelo sistema público. Esses recursos podem ser usados conforme a necessidade dos prestadores de serviço, tanto para a compra de remédios como para o pagamento de pessoal.

EMPRÉSTIMOS

Sem o dinheiro, hospitais do interior do Estado têm sido obrigados a encontrar alternativas para continuar os atendimentos. Em Bauru, por exemplo, o Hospital de Base foi obrigado a fazer um financiamento bancário de R$ 680 mil para cobrir os custos com o serviço de hemodiálise, que atende 119 pacientes de 30 cidades da região, dentre outras despesas. Além desses pacientes, há outros 50 doentes que são submetidos a diálises em suas próprias casas.

"Vamos pagar juros de 4% ao mês para bancar o atraso", afirma Reinaldo Rocha, presidente da Associação Hospitalar de Bauru (AHB), que atende doentes renais crônicos em três unidades do município: Hospital de Base, Maternidade Santa Isabel e Hospital Manoel de Abreu.

Segundo ele, a AHB tem R$ 833 mil a receber pelos atendimentos do SUS, R$ 533 mil em duas parcelas mensais atrasadas do Integra SUS e R$ 300 mil do Programa de Terapia Renal Substitutiva, que deveriam ter sido pagos no dia 15 de dezembro.

De acordo com Rocha, há um temor dos prestadores de serviço de que o atraso se prolongue até o mês que vem, o que poderia inviabilizar a manutenção dos atendimentos, uma vez que o Hospital de Base - o único que dispõe das máquinas para a hemodiálise - já acumula um déficit mensal de R$ 500 mil por conta da defasagem dos valores pagos pelo SUS. Os pagamentos do governo são feitos dois meses depois de prestados os serviços de atendimento dos hospitais.

"O pior é que o empréstimo serve para bancar o atraso num tipo de procedimento cuja tabela de preço não é reajustada há cinco anos", complementa Rocha. "A situação se torna insustentável por conta do déficit mensal que temos", explica.

PROMESSAS

O Ministério da Saúde reconheceu o atraso no repasse do pagamento de hemodiálises. Por meio de sua assessoria de imprensa, informou que o problema foi restrito ao Estado de São Paulo e prometeu regularizar a situação a partir do dia 2.

De acordo com o ministério, esse atraso específico ocorreu porque o Estado ultrapassou o limite de hemodiálises no mês de outubro. O gasto mensal, de R$ 92 milhões, chegou a R$ 105 milhões naquele mês devido a um maior número de atendimentos. Por causa desse aumento imprevisto, foi necessário requisitar uma suplementação, já aprovada pelo governo.

MAIS PROBLEMAS

"Estamos em alerta porque sempre vivemos esse tipo de situação e em todas as ocasiões quem sofre são os pacientes", diz o presidente da Associação Bauruense de Apoio e Assistência ao Renal Crônico (Abrabec), Nelson Rosa.

De acordo com a Abrec, o serviço de hemodiálise em Bauru é feito em 22 máquinas de um único hospital, o de Base. Ele lembra que cinco máquinas quebraram em setembro, causando transtorno geral e obrigando o hospital a transferir pacientes para outras regiões, uma vez que hemodiálises marcadas tiveram de ser canceladas. "Isso representa um perigo para nós, que não podemos ficar sem as sessões de hemodiálise."

Rosa diz que a esperança é que o Hospital Estadual Armando Prado Curvello, da Unesp de Botucatu, passe a prestar o serviço a partir do ano que vem. "Há essa informação, esperamos que isso seja confirmado para que possamos ter mais segurança no nosso tratamento", diz.