Título: País começa em janeiro a enriquecer urânio
Autor: Clarissa Thomé
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/12/2005, Nacional, p. A6

Produção em escala industrial se inicia no dia 17 em Resende, no Rio

Depois de dois anos de polêmicas e adiamentos, a Fábrica de Combustível Nuclear das Indústrias Nucleares do Brasil (INB)começa a enriquecer urânio em escala industrial no dia 17 de janeiro. A unidade de enriquecimento - em Resende, na região do Vale do Médio Paraíba, onde ficam as centrífugas brasileiras que aguçaram a curiosidade internacional - será inaugurada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A previsão da INB é que no ano 2010 a fábrica já consiga produzir o suficiente para abastecer as usinas de Angra 1 e 2. O enriquecimento do urânio representa 35% do custo da transformação do minério em combustível nuclear. O quilo do urânio natural salta de US$ 40 para US$ 1.500. "A INB é uma indústria que agrega valor ao urânio. Poucos países dominam a tecnologia e o Brasil está hoje nesse grupo dos que detêm o conhecimento do ciclo completo do combustível nuclear", disse o diretor de Produção do Combustível Nuclear, Samuel Fayad Filho.

As centrífugas desenvolvidas no Centro Tecnológico da Marinha, em Aramar (SP), são mais econômicas do que as tradicionais. Elas não giram sobre eixo mecânico, mas sim magnético, o que representa menos desgaste do material e conseqüente redução dos custos.

O anúncio de que o País estava pronto para enriquecer urânio provocou desconfiança na comunidade internacional. A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) pressionou durante dois anos para que seus técnicos tivessem acesso irrestrito ao equipamento brasileiro. Pelo acordo final, os inspetores terão acesso visual às tubulações, conexões e válvulas, mas não ao corpo da centrífuga. Também foram acertadas outras salvaguardas como a posição de câmeras que fiscalizarão a quantidade de material que entra e sai, números de visitas anunciadas e de visitas-surpresa.

Desde agosto a fábrica está em fase de comissionamento - pequena quantidade de urânio já transformado em gás (UF6) foi injetada para teste. Nesse período, foi possível garantir que não há vazamento e que as máquinas funcionam perfeitamente. Os planos iniciais prevêem a construção de quatro módulos com dez cascatas cada (conjunto de centrífugas que fazem o enriquecimento).

O prédio do primeiro módulo foi reaproveitado do antigo projeto de desenvolvimento de jato-centrífuga fechado com a Alemanha há 20 anos e abandonado em 1989. Lula vai inaugurar a primeira cascata do primeiro módulo. Para completar o projeto, calcula-se que sejam necessários R$ 250 milhões.