Título: Governo e oposição atropelam calendário e saem em campanha
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/01/2006, Nacional, p. A5

Enquanto esperam resposta do STF sobre verticalização, os dois lados se mobilizam e discutem alianças

BRASÍLIA - Mesmo a nove meses da eleição, e ainda longe do prazo legal para começar, a campanha presidencial terá início, de fato, já neste mês. Aviões do governo e dos partidos de oposição vão cruzar o País de norte a sul e de leste a oeste, numa pré-campanha disfarçada. Ela começará não apenas pelos discursos, já assumidos tanto pelos governistas quanto pela oposição, mas com uma ação coordenada e com objetivo certo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende percorrer em janeiro municípios de pelo menos dez Estados onde haverá expansão de universidades públicas, conforme anunciou na quarta-feira. Nessas cidades estão os formadores de opinião e os estudantes, historicamente mobilizados. Os dirigentes do PSDB vão varar o País para costurar alianças e iniciar o embrião de um projeto comum de governo, como já anunciou o presidente dos tucanos, senador Tasso Jereissati (CE).

Tudo isso, enquanto os dois lados aguardam a definição do Supremo Tribunal Federal (STF) ou do próprio Congresso sobre a verticalização, a regra que obriga as coligações dos partidos nos Estados a obedecerem à que for feita no plano federal. Essa foi a norma que valeu para as eleições de 2002.

Será uma campanha diferente da de 2002. Haverá menos dinheiro por causa do escândalo do mensalão e do caixa 2. Esse escândalo, que o presidente Lula qualificou de "facada nas costas", atingiu seu governo e impedirá, por exemplo, que se repita na campanha eleitoral do ano que vem a dobradinha PT-PL. Poderá afastar do candidato oficial partidos hoje aliados, como o PTB e o PP. Em compensação, deverá unir o PSDB e o PFL, vitoriosos em 1994 e 1998, e derrotados em 2002, quando brigaram. PPS, PDT e PSOL terão candidatos e esperam ser o fator decisivo da eleição.

PRÉ-CANDIDATOS

"As regras para a eleição só serão conhecidas em março. Enquanto isso, vamos manter as conversações, principalmente com o PFL", diz o deputado Bismarck Maia (CE), ex-secretário-geral do PSDB. "Queremos também ver se dá para fazer parcerias com o PDT e o PPS."

O PDT, no entanto, não abre mão da candidatura própria à Presidência da República no primeiro turno. Tem três pré-candidatos: os senadores Cristovam Buarque (DF) e Jefferson Péres (AM) e o governador de Alagoas, Ronaldo Lessa.

"Vamos lançar candidato. Esperamos fazer um acordo com o PPS e com o PSOL para nos tornarmos fator decisivo no segundo turno, caso a eleição se polarize entre o presidente Lula e o candidato do PSDB", afirma Cristovam. "Se conseguirmos, vamos definir a eleição."

Candidato oficial do PPS, o deputado Roberto Freire (PE) acha que a definição geral em todos os partidos só ocorrerá depois que for encontrada uma solução para a verticalização. "Na situação atual não temos condição de fazer uma aliança nacional, porque ela vai atrapalhar nossos candidatos nos Estados", afirma Freire.

Por enquanto, o PPS está atrás de partidos nanicos. Já fechou com o PHS. Sobre o sonho do PSDB de atraí-lo, Freire considera isso impossível no primeiro turno: "O PSDB não conseguiu fazer a autocrítica da política econômica. Tanto é que faz uma oposição meia-bomba ao PT, porque, ao lado do PFL, cria um cinturão de proteção ao ministro Antonio Palocci."

PARCEIROS

O PT sabe que é o mais prejudicado entre os partidos, por ter se envolvido no escândalo do mensalão - o pagamento de mesada a parlamentares da base do governo - e do caixa 2, comandado pelo ex-tesoureiro Delúbio Soares e operado pelo empresário Marcos Valério de Souza. "A crise fará com que o PT busque somente a ajuda de parceiros tradicionais, como o PC do B e o PSB", analisa o secretário-geral petista, deputado estadual Raul Pont (RS).

Pont é da corrente à esquerda do PT. Mas outros dirigentes do partido também não acreditam numa coligação ampla com partidos de centro-direita, como ocorre hoje. "Temos de pedir desculpas à população e mostrar que 90% do PT são honestos", diz o líder do partido na Câmara, Henrique Fontana (RS). "Um erro que não podemos cometer é negar que houve caixa 2. Temos de assumi-lo."

Fontana acha que a imagem de Lula pode ser recuperada se forem destacadas suas ações na área social, como o Bolsa Família, os empréstimos consignados e o financiamento da agricultura familiar. O líder do PT defende o lançamento da candidatura à reeleição o mais rapidamente possível.

Lula insiste que só vai se decidir no ano que vem. Mas, para muitos analistas, ele não tem escolha. Como o PT está numa situação ruim, sua candidatura poderia puxar votos para o partido. Além do mais, o PT não tem um substituto para Lula.