Título: O fim da dívida externa
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/01/2006, Economia & Negócios, p. B2

O governo petista considera que a redução da dívida externa é um dos trunfos mais importantes da sua política econômica. A tal ponto que o presidente Lula convidou o diretor-gerente do FMI, Rodrigo de Rato, a lhe dar uma ajuda na campanha para a reeleição, participando, no Brasil, da cerimônia comemorativa do pagamento antecipado da dívida do País com o organismo internacional. Não cabe menosprezar a enorme redução da dívida líquida em dólar do Brasil, que, de US$ 124 bilhões no final de 2003, é hoje menor que US$ 16 bilhões e poderá ser zerada no prazo de um mês. Esse resultado é por causa, de um lado, do desempenho da balança comercial e, paradoxalmente, da forte intervenção do Banco Central (BC) e do Tesouro Nacional no mercado de câmbio para, sem grande sucesso, conter a apreciação do real em relação à moeda norte-americana. Embora o presidente da República tivesse dado uma relevância política ao reembolso da dívida com o FMI, que, segundo ele, marca a independência do Brasil em relação ao imperialismo norte-americano, o efeito prático imediato dessa extinção da dívida externa é que permite ao País se apresentar como altamente solvável, o que se traduziu por forte queda do "risco Brasil". Assim, o acesso ao mercado financeiro mundial se torna mais fácil e mais barato em termos de juros pagos. A dívida interna atrelada ao dólar, que era em 2002 de US$ 77,3 bilhões, é hoje de apenas US$ 2,3 bilhões; a dívida externa líquida do governo (isto é, os recursos tomados pelo governo no exterior, descontados os dólares das reservas internacionais e colaterais) caiu de US$ 56 bilhões, no final de 2002, para US$ 24,5 bilhões. Mantidas as compras pelo BC, US$ 550 milhões ao dia, como atualmente, a dívida líquida vai ser zerada. Essa é a conseqüência da intervenção do BC e do Tesouro para obter uma desvalorização do real. Como a compra de dólares é feita em reais, aumenta o volume de moeda em circulação, o que exige a emissão de títulos da dívida interna para enxugar a liquidez, elevando, portanto, a dívida interna. Desse modo, troca-se um passivo externo que paga taxa de juros de cerca de 8% ao ano por um passivo interno sujeito à taxa Selic, muito maior. O swap reverso apresenta a mesma elevação de custo, pois se troca uma dívida em dólar, que paga juros de cerca de 4% ao ano, por outra, em reais, com juros de mais de 16% ao ano.Todavia essa diferença de custo é compensada por uma melhora do perfil da dívida, que é mais importante do que seu volume aos olhos dos investidores. Não se sabe, entretanto, até que ponto o BC e o Tesouro podem continuar intervindo no câmbio, o que deixa prever maior valorização do real.