Título: Preço entrava liberação de remédio
Autor: Adriana Dias Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/01/2006, Vida&, p. A13

Uma disputa de preços está adiando a chegada do bevacizumabe, remédio de nova geração para câncer de cólon retal, o quarto de maior incidência no Brasil ¿ serão 25 mil novos casos em 2006 no País, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca). Fabricado pelo laboratório Roche, ele já é usado em pelo menos 50 países como tratamento padrão nos casos avançados da doença, em que há metástase (espalhamento por outros órgãos). A novela começou em maio, quando o registro sanitário do Avastin (nome comercial do remédio) foi concedido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O entrave está na definição do preço. ¿Todo remédio sem referência de valor passa por um setor especial de regulação¿, explica Pedro Bernardo, gerente de Regulação de Mercado da Anvisa. Trata-se da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED).

O governo defende o valor a partir de cerca de R$ 300. O laboratório pede pelo menos quatro vezes mais. A decisão final, prevista para ocorrer neste trimestre, foi para um conselho de ministros. ¿Como um julgamento de última instância, os ministros da Saúde, Fazenda, Justiça, do Desenvolvimento e da Casa Civil ou seus representantes, se reúnem para determinar definitivamente o preço¿, afirma Bernardo. A Roche pode ainda pedir uma revisão do valor ao Judiciário, mas é difícil que isso ocorra. Em nota, a empresa divulgou: ¿Estamos otimistas e empenhados em obter a aprovação o mais breve possível. Já tivemos outros remédios no conselho e se chegou a acordo.¿

NO EXTERIOR

O bevacizumabe foi aprovado pelo FDA, órgão americano que regula medicamentos, em fevereiro de 2004. No Brasil, para conseguir o remédio, o paciente tem de desembolsar cerca de R$ 7 mil pela dose em importadoras ou entrar com uma ação judicial contra planos de saúde ou governo. ¿Dos meus 20 casos na Justiça, 10 são para conseguir o Avastin¿, conta a advogada Renata Vilhena Silva, especialista na área. Só no ano passado, a Secretaria de Estado da Saúde recebeu 63 ações de pacientes para conseguir o remédio. A aposentada Júlia Maria Raineri, de 63 anos, é uma delas. ¿Minha médica chegou dos Estados Unidos com a notícia do medicamento. ¿Gastei minhas economias e me endividei nas primeiras cinco aplicações da dose¿, conta ela, que ganhou liminar depois disso. ¿Meu câncer regrediu e nunca estive tão disposta.¿

O remédio age como anticorpo de uma proteína chamada VEGF. ¿Essa proteína tem como característica estimular a formação de vasos para aumentar a quantidade de nutrientes das células do câncer (veja quadro ao lado). É o primeiro a fazer isso¿, diz Bernardo Garicochea, oncologista do Hospital Sírio-Libanês e diretor do serviço de oncologia da PUC do Rio Grande do Sul.

Não significa, claro, a cura da doença. ¿O câncer tem outras formas de crescer¿, diz Vladmir Cordeiro de Lima, oncologista do Hospital do Câncer. ¿O remédio adia o progresso da doença. O tempo é muito bom, de pelo menos seis meses.¿ Não é pouco. A expectativa média de vida para quem tem câncer de cólon retal com metástase é de 15 a 17 meses. O Avastin está sendo testado em tumores de mama e de pulmão.