Título: Para vice do Cimi, falta de terras é que os deixa doentes
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/01/2006, Nacional, p. A4

BRASÍLIA - A precária saúde das populações indígenas está associada a outro problema, além da ineficiência na estrutura oferecida: especialistas não hesitam em vincular os baixos indicadores à questão fundiária. Da população total, 35% residem em apenas 1,3% da terra dos índios. ¿Sem terra, eles perdem todo o vínculo com a cultura tradicional, o que agrava problemas como desnutrição e as mortes por causas violentas, como o suicídio¿, constata o vice-presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Saulo Feitosa.

O atual governo, segundo ele, reservou uma triste surpresa nesta área: ¿Contávamos com um ritmo mais rápido de demarcação nas terras indígenas. Mas foi uma ilusão¿, afirma. Pelas contas de Feitosa, o governo Lula registrou uma média de 6 demarcações por ano, média que perde até para o governo do general João Figueiredo, que fez na média oito demarcações anuais. ¿Foram feitas homologações, é verdade, mas eram apenas confirmações de processos que já vinham sendo desenvolvidos.¿

A íntima relação entre saúde e terras é confirmada pelo coordenador do Programa Xingu da Universidade Federal de São Paulo, Douglas Rodrigues. Ele compara os casos de desnutrição de algumas aldeias do Xingu com outras do Rio Negro. ¿Em algumas aldeias do Xingu, as taxas chegam a 20%. No Rio Negro, em aldeias Maku-Hupta, por exemplo, onde o meio ambiente foi alterado por atividades no entorno da reserva, o índice chega a 70%¿, compara. Desnutridos, o risco de morrer por diarréias, pneumonias ou tuberculose aumenta de forma significativa.

A terra, afirma Rodrigues, também é o alicerce para a manutenção das tradições. ¿Quando este vínculo se rompe, outros ficam frágeis. O que expõe mais ainda a população a comportamento de risco.¿ Tabus ajudam a evitar, por exemplo, a gravidez na adolescência. O resguardo, quando respeitado, evita duas gestações muito próximas. ¿O desmame nas tribos geralmente é tardio. Mas se a mulher engravida de novo, acaba abandonando a amamentação do filho, aumentando o risco da desnutrição.¿