Título: Educação e desenvolvimento
Autor: Mailson da Nóbrega
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/01/2006, Economia & Negócios, p. B5

A perda de dinamismo da economia brasileira tem como principal causa, a meu ver, a Constituição de 1988, que adotou os já então carcomidos ideais estatistas do nacional-desenvolvimentismo, concedeu incríveis benefícios a aposentados e funcionários públicos e elevou as vinculações de receitas. O resultado foi a explosão do gasto público, o aumento da rigidez orçamentária, elevação brutal da carga tributária e novas barreiras aos ganhos de produtividade. O esgotamento do nacional-desenvolvimentismo também tem muitas causas, entre as quais a perda de sustentação fiscal, a tolerância à inflação e o descaso com a educação.

Nada disso é claro para quem defende como saída a adoção de uma política industrial e de medidas geradoras de juros baixos e câmbio alto. Dá-se como exemplos China e Índia, que supostamente estão dando certo porque seguem esse figurino.

Imaginar que o êxito recente desses países resulta desses fatores é desprezar a origem dos altos ganhos de produtividade que explicam seu desenvolvimento. Esse êxito deve muito à educação. A Índia investiu maciçamente em educação após sua independência em 1947, mas adotou um intervencionismo estatal excessivo que inibiu o crescimento por cerca de 40 anos.

Após as medidas de liberalização adotadas a partir de 1985 pelo primeiro-ministro Rajiv Ghandi (aqui se diria neoliberalismo), que foram mantidas e ampliadas depois, a Índia deixou de ser um centro exportador de cérebros para países desenvolvidos e passou a aproveitar o potencial de seus investimentos em educação. As exportações da indústria de tecnologia de informação e serviços correlatos devem atingir US$ 60 bilhões até 2010. As escolas superiores graduam 2,5 milhões de estudantes por ano, dos quais 250 mil engenheiros.

O foco na educação é também a característica da China, que nessa área rapidamente se livrou de preconceitos ideológicos e não sofre da doença dos privilégios que garante educação superior gratuita para ricos no Brasil. Um quarto do orçamento das universidades públicas chinesas provém de mensalidades pagas. Gratuidade, só para quem não pode pagar.

A China forma por ano dez vezes mais engenheiros do que os EUA. Cerca de 200 mil chineses fazem mestrado e doutorado na Europa e EUA. Se o Itamaraty dispensou o teste de inglês para ingresso na carreira diplomática, a China tornou obrigatórias 4 horas semanais de ensino do idioma a partir do 3º ano do ensino fundamental.

Uma prova da revolução e do pragmatismo educacional na China foi a inauguração, ano passado, do campus avançado da Universidade britânica de Nottingham em Ningbo. É o primeiro campus estrangeiro desde o advento do comunismo em 1949. As aulas são dadas em inglês e os estudantes pagam US$ 6,2 mil por ano, dez vezes mais que em outras universidades.

O campus tem como sócio uma empresa estatal da área educacional, à qual pertencem os ativos e o controle do conselho de administração. Compete à universidade de Nottingham recrutar estudantes e professores, escolher os cursos, selecionar o conteúdo, conduzir os exames e conceder os títulos.

Para se ter idéia da postura que impera na China nessa área, basta mencionar o que aconteceu na primeira eleição do presidente da associação de estudantes do campus. Como assinalou a The Economist (10/11/2005), o eleito foi um britânico, Mark Curry. O fato assume maior importância, diz a revista, quando se sabe que as eleições para organizações estudantis são fortemente controladas pelo Partido Comunista por meio da Liga da Juventude Comunista.

Enquanto isso, o atual governo brasileiro quer aumentar os recursos públicos para as universidades, é leniente com greves de professores e por certo veria com reservas o funcionamento de uma universidade estrangeira como a de Nottingham na China.

E continua a ladainha dos que acham que basta reduzir o superávit primário, baixar o juro e elevar o câmbio para que se opere o milagre da multiplicação do desenvolvimento.