Título: Estudo mostra que gasto maior não influencia eleição
Autor: Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/01/2006, Nacional, p. A5

Conclusão, baseada em 347 disputas, é que os eleitores punem déficit

RIO - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está apostando no efeito eleitoral de ampliar os gastos públicos em 2006, mas, se tivesse acesso a um estudo feito recentemente por dois economistas israelenses, talvez ficasse menos confiante naquela estratégia. O trabalho analisou estatisticamente o resultado de 347 eleições presidenciais ou para primeiro-ministro em 74 países, entre 1960 e 2003. E o resultado encontrado por Adi Brender e Allan Drazen (professor da Universidade de Maryland,nos EUA) foi surpreendente: aumentar o déficit público no ano das eleições, ou ampliar os gastos públicos, não ajuda em nada um líder a se reeleger, ou a eleger o candidato do seu partido. "O eleitorado é muito mais inteligente do que se imagina, e percebe quando está sendo manipulado", diz Brender, que falou com o Estado por telefone do seu escritório no Banco de Israel (Banco Central), em Tel-Aviv. De acordo com o estudo, há indicações de que os eleitores em todo o mundo são "conservadores em termos fiscais, e punem, ao invés de premiar, gastos deficitários e manipulação fiscal, principalmente quando percebem que têm motivos eleitoreiros". Isto se dá com mais força nos países ricos, mas também ocorre nos emergentes.

Um exemplo de resultado que entrou na base de dados dos dois pesquisadores foram as eleições parlamentares na Hungria em 2002, nas quais o primeiro-ministro,o conservador Viktor Orban, foi derrotado pela coalizão socialista-liberal, de oposição, apesar de o déficit público ter inchado em 5,87 pontos porcentuais do Produto Interno Bruto (PIB), para 8,84%, segundo os autores do estudo. Brender frisa, porém, que não é apontando casos específicos que o estudo chega às suas conclusões (há episódios de reeleição com gastança), mas sim investigando a correlação estatística entre gastos e resultados eleitorais.

No trabalho, ele e Drazen fazem uma separação entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento. Em ambos os casos, aumentar o déficit público ao longo do mandato é um fator relacionado com uma redução das chances de um presidente ou primeiro-ministro se reeleger ou fazer seu sucessor.

Quando a análise se restringe ao último ano do mandato, há diferença entre esses dois grupos. No caso dos países desenvolvidos, o aumento do déficit piora as chances de reeleição, e, inversamente, a austeridade fiscal ajuda: um aumento de 1 ponto porcentual de PIB no superávit fiscal em um ano eleitoral aumenta as chances de reeleição de 7% a 9%. No caso dos países em desenvolvimento, o impacto do resultado fiscal no último ano do mandato sobre a probabilidade de reeleição é nulo.

CRESCIMENTO

Os economistas analisaram também como o crescimento econômico afeta a probabilidade de um chefe de governo reeleger-se ou fazer seu sucessor. E, novamente, os resultados variaram entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento.

No primeiro caso, o crescimento não afeta as perspectivas eleitorais. Já nos países emergentes, ele aumenta as chances de reeleição. Mas a variável decisiva é o crescimento ao longo do mandato. As chances de reeleição não são afetadas pelo fato deste crescimento se concentrar mais ou menos no último ano do mandato. Pelo estudo, um aumento médio de 1 ponto porcentual na taxa de crescimento anual do PIB durante o mandato aumenta de 7% a 9% a probabilidade de reeleição nos países em desenvolvimento. Para Lino Olivares, economista-chefe do Opportunity Asset Management, "nos países menos desenvolvidos, o Estado é visto como indutor do crescimento, enquanto nos desenvolvidos este papel é do setor privado".

Os economistas israelenses conseguiram mostrar também que, de forma surpreendentemente racional, os eleitores premiam o crescimento com causas internas, e são relativamente indiferentes ao que deriva do dinamismo da economia global. "Este foi um dos resultados mais interessantes do trabalho para mim", disse Brender.

REAÇÃO

Ele acha que faz sentido a diferente reação dos eleitores dos países desenvolvidos e dos em desenvolvimento. Argumenta que no mundo emergente os governos têm um papel mais importante na economia, contribuindo para a estabilidade institucional, o ambiente de negócios, as regras, o direito de propriedade, etc. "Já nos países desenvolvidos, tudo isto já existe, e a margem que os governos têm para influenciar o crescimento é muito menor."