Título: O que mudar nos juros (1)
Autor: Celso Ming
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/01/2006, Economia & Negócios, p. B2

A gritaria contra os juros altos passa a impressão de que todas as críticas vão na mesma direção. Não há quem não queira juros baixos, até mesmo o Banco Central. Mas a unanimidade termina aí.

A maioria dos críticos simplesmente não gosta de juro alto porque não gosta de juro alto; não sabe o que propor para obter o efeito desejado.

Mas alguns segmentos da sociedade chegam a formular mudanças. Nem sempre essas propostas vêm elaboradas. Algumas delas estão vagamente sugeridas nas críticas. Convém examiná-las, uma a uma.

Correção de dose ¿ Há aqueles que insistem em que o Banco Central exagerou na mão. Foi longe demais no aperto monetário que começou em setembro de 2004 e trabalha lentamente demais no desaperto. Nessa barbeiragem, deixou morrer o motor do crescimento.

O Banco Central não aceita essa crítica porque ¿ argumenta seu presidente, Henrique Meirelles ¿ a inflação de 2005 ficou mais alta do que a meta de 5,1%; se a meta não foi atingida, não se pode falar em erro de dose.

Contra essa resposta de Meirelles, pode-se insistir em que a meta não precisa ser cumprida rigidamente dentro do período de 12 meses de cada ano. Desde que a convergência da inflação para a meta esteja assegurada, como parece, tudo bem deixar escapar o mês de dezembro, porque, lá na frente, as coisas tendem a se arrumar naturalmente.

Ainda assim, essa proposta exige certa flexibilização da administração do regime de metas, cujos termos em lei ainda fazem questão do calendário gregoriano.

Pode-se ainda dizer que, se houve erro de dose, é fácil corrigir. Isso é como descalçar bota apertada. É só baixar mais rapidamente os juros que o alívio vem em seguida.

De todo modo, as críticas que se atêm ao erro de dose não questionam o regime de metas em si mesmo; apenas o tamanho e a intensidade do ajuste.

Correção da meta ¿ Outra camada de analistas e de formadores de opinião não se limita a malhar o Banco Central por pretender ser mais católico do que o papa. Centra sua crítica no Conselho Monetário Nacional (CMN), que estaria fixando uma meta inflacionária despropositada ou dura demais para ser cumprida.

Entre os que pensam assim estão os dirigentes da Fiesp, para os quais o CMN está dominado por obcecados. Assim, segundo eles, é preciso dar assento no CMN a gente que pense mais como produtor do que como exterminador de inflação e, assim, arranque uma meta de inflação cujo cumprimento não tire tanto sangue do consumidor e do sistema produtivo.

A esses o Banco Central responde que isso é pretender aumentar o índice olímpico da corrida de 100 metros rasos para alguma coisa como 12 segundos, quando as marcas mundiais já estão abaixo dos 9,9 segundos.

A maioria dos países emergentes, argumenta o ministro Antonio Palocci, está com inflação abaixo dos 3% e nós ainda estamos acima dos 5%. Temos de baixar mais nossa meta agora, para aproveitar as boas condições da economia mundial, conclui ele.

De todo modo, esta é uma questão de escolha que vale a pena discutir. Todo combate à inflação impõe custos em quebra de crescimento econômico, adiamento do consumo e contenção do desemprego. Diante disso, é preciso saber qual nível de inflação a sociedade está disposta a tolerar.

No entanto, a meta de 2006, 4,5% de inflação (com 2% de área de escape), vai ser bem mais moleza cumprir do que foram os 5,1% da meta de 2005. É o que, no momento, desaconselha revisão de meta. (Amanhã continua).