Título: Conferência reúne na Austrália os grandes poluidores da Terra
Autor: Cristina Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/01/2006, Vida&, p. A18

Estados Unidos e Austrália lideram debate sobre tecnologias que privilegiam uso de carvão

Os maiores poluidores do mundo terminam hoje, na Austrália, uma conferência de dois dias a portas fechadas para discutir como conter as mudanças climáticas provocadas pelo homem sem diminuir o crescimento econômico. Estão reunidos representantes dos Estados Unidos, Austrália, China, Índia, Coréia do Sul e Japão. Eles formam a Parceria do Pacífico-Asiático pelo Desenvolvimento Limpo e o Clima, pacto formatado em julho do ano passado. ¿Todos os países-membros querem que suas economias continuem crescendo. Mas todos têm responsabilidades ecológicas que também querem assumir. O maior desafio consiste em trabalhar com o setor privado, e não apenas com os governos¿, disse o chanceler australiano, Alexander Downer.

São poucos países, mas representam 45% da população mundial e quase metade do Produto Interno Bruto (PIB) do planeta, do consumo de energia e das emissões de gases estufa. Em comum, além de um grande apetite pelo crescimento econômico, são todos dependentes de uma base energética suja, que prioriza a queima de carvão ¿ uma das principais fontes de gases do efeito estufa.

CRÍTICA

Por causa desse perfil, críticos vêem o evento como uma reunião de negócios, não um encontro que busca manter a saúde da Terra. ¿Trata-se sem dúvida de uma conferência sobre como vender urânio e carbono, enquanto enfrentamos o aquecimento global¿, diz Danny Kennedy, do Greenpeace.

De fato, dezenas dos principais produtores de energia e fornecedores de matéria-prima estão lá. ¿A razão pelo interesse contínuo em carvão é o reconhecimento de que a demanda global por energia cresce rapidamente, e essa demanda não pode ser suprida sem o carvão¿, diz o diretor-executivo da Associação Australiana de Carvão.

O pacto é paralelo à Convenção sobre Mudança Climática das Nações Unidas e a seu filhote mais famoso, o Protocolo de Kyoto. Das seis nações, Estados Unidos, Austrália e Coréia do Sul não participam do acordo, que estabelece metas de redução da emissão de gases do efeito estufa, como gás carbônico e metano, e defendem que a indústria se auto-regule.

Índia e China ratificaram o protocolo, mas não têm metas por serem países em desenvolvimento ¿ pelo menos por enquanto, uma vez que a União Européia tenta criar objetivos claros para os dois (além do Brasil) a partir de 2013, por apresentarem grandes taxas de emissão de carbono. Apenas o Japão tem metas.

¿O espírito desse encontro não é reduzir emissões; é contrário ao espírito da convenção¿, diz o secretário de Meio Ambiente de São Paulo, José Goldemberg, que participou das negociações em Kyoto. Segundo ele, os Estados Unidos querem vender tecnologia para capturar o carbono emitido pelas termoelétricas. Entre elas está o seqüestro de carbono nas usinas ¿ que é retido antes que atinja a atmosfera ¿, armazenado no subsolo.

Mas China e Índia podem não aplicar essas tecnologias, pois o carvão que utilizam é de qualidade inferior e emite não apenas carbono, mas outros poluentes, como enxofre. ¿Eles querem dar uma solução tecnológica para o problema, sem sacrificar o crescimento econômico. Só que essa modernidade também é muito cara¿, explica Goldemberg. ¿Além disso, eles não resolvem a origem do problema, só deixam para depois.¿

Ambientalistas que acompanham o encontro afirmam que o enfoque é dado exclusivamente a técnicas ainda experimentais, as quais favorecem apenas o setor que usa combustíveis fósseis, em vez de aplicar recursos em fontes de energia renováveis, como vento e luz, captadas por tecnologias já testadas.

¿A conferência vai falhar se não criar regras e grandes incentivos financeiros para que a indústria gaste hoje bilhões e bilhões de dólares em energia limpa¿, diz Erwin Jackson, gerente da Fundação Australiana de Conservação. ¿Se a indústria do carvão só tiver de se limpar em 15 ou 20 anos, perderemos uma oportunidade.¿

Especialistas acreditam que o efeito estufa, causado pela ação do homem, irá provocar mudanças climáticas que ameaçarão todo o planeta.