Título: Brasil adia enriquecimento de urânio
Autor: Karine Rodrigues
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/01/2006, Internacional, p. A12

RIO - Marcado para ser iniciado hoje ¿ na presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ¿ o enriquecimento de urânio em escala industrial realizado pelas Indústrias Nucleares do Brasil (INB) foi adiado. A mudança de data é um problema recorrente, já que o começo das atividades foi prorrogado por quase dois anos, por causa da insistência da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) em ter acesso à tecnologia brasileira. A inspeção teria como objetivo garantir que o material produzido não seria usado em bombas atômicas. Segundo a assessoria de imprensa da estatal, situada em Resende (RJ), a nova data de inauguração depende ¿da agenda das autoridades¿. Lula tem compromissos no Rio na sexta-feira, mas a possibilidade de que a unidade entre em operação durante a visita presidencial foi descartada. A Fábrica de Combustível Nuclear está funcionando em fase de testes desde agosto. Durante este período, foi produzida uma pequena quantidade de urânio enriquecido para adaptar as centrífugas aos padrões necessários à produção industrial e também para atender aos requisitos da Comissão Nacional de Energia Nuclear, da AIEA e da Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (ABACC).

Mas a etapa de checagem deveria ser encerrada em janeiro, segundo a direção da INB, que já admitiu problemas de restrição orçamentária. Com isso, o cronograma do projeto foi afetado, adiando de 2008 para 2010 a conclusão da primeira etapa, quando 10 conjuntos de centrífugas serão capazes de produzir, anualmente, 114 mil Unidades de Trabalho Separativo (UTS) ¿ medida utilizada para o urânio. Este total corresponde a 60% das necessidades de combustível nuclear das usinas de Angra 1 e Angra 2. Para atingir a auto-suficiência, é preciso quase o dobro de urânio enriquecido, no total de 203 mil UTS.

O orçamento para o projeto de enriquecimento previsto para este ano é de R$ 22,4 milhões, informou a assessoria, admitindo, porém, que o dobro desse valor seria ideal para garantir o cumprimento da meta de 2010.

O processo de enriquecimento do urânio corresponde a 35% do custo da transformação do minério em combustível nuclear. Na forma natural, o quilo custa US$ 40, mas quando é enriquecido, ou seja, tem a sua concentração aumentada, passa a custar US$ 1.500. Para ser usado na geração de energia, o grau de enriquecimento varia entre 3% e 4%. Já para artefatos bélicos é necessário se chegar a 90%. Atualmente, o urânio extraído na Bahia é transformado em uma pasta amarela (yellow cake), enviado para o Canadá, onde é modificado para a forma de gás, e, em seguida, enriquecido na Europa, por um consórcio de empresas da Holanda, da Inglaterra e da Alemanha. De volta ao Brasil, é convertido em pó, prensado em pastilhas e acondicionado em varetas, que são usadas como combustível nas usinas.