Título: Resultados bons para o mercado. E crescimento pífio
Autor: Patrícia Campos Mello
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/01/2006, Economia & Negócios, p. B3

Principais países desenvolvidos ou emergentes tiveram desempenho do PIB superior ao do Brasil em 2005

O risco país está no nível mais baixo da história, o Brasil pagou tudo o que devia ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e a inflação fechou o ano em 5,69%. Mas crescimento que é bom, nada. Enquanto a China cresceu 9,5%, a Índia, 7%, e a Argentina, mais de 8% em 2005, o Brasil deve ter fechado o ano com pífios 2% a 2,3%. O mercado financeiro tece loas à política econômica do Brasil, mas o fato é que o País teve um ano melancólico: nenhum dos principais países desenvolvidos ou emergentes teve crescimento tão fraco como o do PIB brasileiro. Integrantes do governo Lula garantem que o desempenho medíocre é página virada e o Brasil se encaminha para um crescimento acima de 3,5% em 2006. Mesmo assim, o PIB decepcionante pode ser uma pedra no sapato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a campanha à reeleição deste ano.

Há um descompasso entre a percepção do mercado financeiro e dos porta-vozes da economia real. Para muitos analistas, a política econômica foi vitoriosa. "Com a redução da inflação, o Brasil fez um investimento para poder crescer mais no futuro", diz Mário Mesquita, economista-chefe para a América Latina do Banco ABN-Amro. Já para empresários a equipe econômica errou a mão no aperto monetário. Como disse Newton de Mello, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq): "Estão comemorando tanto a política econômica do governo, devem achar que as pessoas se alimentam de risco país", diz Mello.

Mesquita salienta que a prioridade do governo foi desinflacionar a economia, e ele foi bem-sucedido nesta missão. Em maio de 2003, a inflação acumulada em 12 meses era de 17%. No ano passado, ficou abaixo de 6%. "O governo desinflacionou a economia em mais de 10 pontos porcentuais. É natural que, durante este processo, o País cresça menos."

Segundo Mesquita, não existe consenso de que o BC errou a mão na política de juros. "Existe consenso, sim, de que o Brasil cresce menos do que deveria", afirma o economista. "Mas isso acontece porque falta consolidar a estabilidade e aprofundar as reformas, como a trabalhista, para aumentar a produtividade, a da previdência, para resolver o problema fiscal, e a tributária, para reduzir a carga de impostos."

Para ele, o principal argumento a favor da necessidade de uma política monetária restritiva é a própria inflação de 2005, que ficou acima da meta, de 4,5%, e do objetivo que o BC havia fixado posteriormente, de 5,1%. Mas Mesquita admite que o resultado pode ter sido doloroso. "A sociedade pagou um custo em crescimento acima do esperado."

Claudio Loser, pesquisador do Inter-American Dialogue e ex-responsável pelo Departamento de Hemisfério Ocidental no FMI, reage com perplexidade ao frustrante desempenho do Brasil. "Eu não consigo entender como o crescimento do Brasil pode ter caído tanto."

"Fiquei muito surpreso; no início do ano, todo mundo apostava em um crescimento entre 3% e 4%. Aí a política monetária muito apertada e as taxas de câmbio muito valorizadas tiveram impacto na economia brasileira", diz Loser.

SEM MISTÉRIO

Para Walter Molano, professor da Universidade Columbia e diretor de Pesquisas da BCP Securities, não há mistério. "Juros de 18% em um país com inflação abaixo de 6% são ridículos; isso é transferência de riqueza dos pobres para os ricos", diz Molano. Para ele, Lula adotou a austeridade fiscal e ortodoxia monetária para mostrar que um governo de esquerda ia seguir políticas responsáveis. "Mas fez isso durante tempo demais; na América Latina, todos os outros países estão seguindo políticas neutras ou até um pouco expansionistas, não restritivas."

Segundo ele, é "óbvio" que, do ponto de vista dos investidores, está tudo ótimo. "O mercado financeiro vai aplaudir políticas que garantem que o investidor vai ter lucro e receber seu dinheiro de volta", diz. "Mas para quem mora no País é muito pouco; crescer só 2% em 2005 foi uma oportunidade perdida para o Brasil."

Historicamente, uma variação de 2% a 2,3% no PIB não está fora do padrão brasileiro. Nos últimos 25 anos, a média de crescimento do Brasil foi 2,1%.

"Mas a questão é que o cenário externo está muito mais favorável do que a média dos últimos anos", ressalta Ricardo Amorim, diretor de Pesquisas para a América Latina do Banco West LB. Em um ano de liqüidez externa abundante e altos preços de commodities, o Brasil emparelhou com o Japão e a União Européia, que sofrem de crescimento anêmico já há alguns anos.