Título: Alckmin em dias de tudo ou nada
Autor: Angélica Santa Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/01/2006, Nacional, p. A7

Na primeira semana de sua maior batalha para virar nome nacional, governador vive clima de arranque

Transformado em personagem político da semana após declarar que deixa o cargo até 1º de abril para ser pré-candidato à Presidência em tempo integral, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) enfrentou a agenda pública dos últimos dias naquele estado de espírito imortalizado pelo sambista Jamelão: feliz como pinto no lixo. Em cinco dias úteis, ele tirou o nome do prefeito José Serra do caminho da candidatura por aclamação, antecipou o debate eleitoral e foi até chamado de grande estrategista. "Mas, olha, não houve estratégia", disse ele ao Estado, na tarde de sexta-feira. "Uma repórter da CBN perguntou depois de um evento quando eu deixo o cargo. Aí eu respondi. Só não falei antes porque ninguém perguntou..." Mesmo colhendo o que diz não ter plantado, Alckmin anda animado com os efeitos da frase, porque ajuda na guerra maior que tem pela frente. Após 34 anos de carreira política, ele enfrenta um agora ou nunca para virar um nome nacional.

E Geraldinho - como era chamado pelo seu tutor político, o governador Mário Covas - entrou na briga com um ânimo que surpreendeu até os aliados habituados a rir discretamente do apelido "picolé de chuchu", que conseguiu depois de anos à frente de um governo sem bossa. "A repercussão dessa minha declaração mostra que o processo eleitoral já começou em 2006 e as pessoas estão querendo debater o assunto. Então estou bem animado, sim ", afirmou.

Com o Palácio dos Bandeirantes invadido por um clima de campanha, o governador paulista passou a semana com bom humor de candidato em hora de arranque. Despachou com auxiliares de maneira mais efusiva do que de costume, atendeu a telefonemas de políticos interessados em discutir planos de vôo mais rapidamente do que o habitual, repetiu suas costumeiras piadas sobre Pindamonhangaba com freqüência ainda maior - e se divertiu ao ler os noticiários que citavam os efeitos de sua frase. Na manhã de sexta-feira, por exemplo, ria em seu gabinete mostrando o print de uma nota do humorista Tutty Vasques que ironizava as referências à sua esperteza política da semana e dizia: "E o Alckmin, hein?! De tímido não tem nada. Não à toa se casou com aquela mulher bonitona."

Nos bastidores, a semana em que Geraldo Alckmin entrou na guerra pública pela sobrevivência do próprio nome fora dos limites regionais foi definida por assessores como "dedicada à mídia". E cada solenidade foi um flash. Beneficiado pelo silêncio regulamentar de um José Serra de alcance nacional maciço, mas impedido de declarar sua pré-candidatura um ano depois de assumir a Prefeitura, o governador aproveitou todos os eventos previstos na burocracia administrativa de seu cargo para soltar declarações de campanha.

Na segunda-feira, depois de um evento no Bandeirantes, elogiou o vice-governador, o pefelista Claudio Lembo - e deu um jeito de dizer que ele ficará menos de um ano em seu lugar. Na terça-feira, entregou viaturas no Detran e em seguida declarou que, se eleito, pretende defender a implantação de parcerias público-privadas e tocar reformas estruturais urgentes. Depois deixou as autoridades de lado e foi apertar a mão de alguns potenciais eleitores. Na quarta-feira, disse que não pretende montar um ministério com nomes apenas de São Paulo. E, na quinta, depois do lançamento de um programa educacional, soltou uma frase com destinatário conhecido: "É preciso dizer quem é candidato, para que o partido e a sociedade possam avaliar."

AGORA OU NUNCA

O tudo ou nada do governador é definido por um tucano próximo com uma conta simples, uma espécie de jogo de amarelinhas eleitoral. Se conseguir sair candidato, ele tira pela primeira vez seu nome dos limites regionais. Se não conseguir, tem a chance de concorrer ao Senado - uma opção pouco honrosa agora que ele declarou com uma ruma de argumentos que só se interessa pelo Executivo. E, se perder a chance de nacionalizar seu nome e não concorrer a outro cargo, ficará dois anos no estaleiro - em um movimento que pode ser interpretado como recuo em sua biografia, depois de governar o Estado. O governador, no entanto, afirma que não faz cálculos do gênero. "Trabalho pela pré-candidatura e não fico pensando em outra coisa. Mas política é destino, as coisas acontecem de forma natural. Não existe tudo ou nada nesse mundo."

As movimentações de Alckmin mostram como ele anda aplicado em viabilizar seu nome. Todos os domingos em que não está viajando, reserva o horário das 19 às 22 horas para ouvir empresários. Ao longo da semana, telefona para especialistas para discutir um rascunho de plano de governo. Fala com Fernando Henrique Cardoso quase todos os dias. E como o candidato tucano terá de ter apoio do baixo clero do partido, mesmo que o nome saia do colégio eleitoral, tenta se vender como nome capaz de unificar o partido. Nas próximas semanas, começa a rabiscar sua agenda de compromissos fora de São Paulo - deve ir ao Paraná e a alguma cidade nordestina.

Alckmin está há 11 anos no Palácio dos Bandeirantes. Entrou em janeiro de 1995, eleito vice de Mário Covas - e ficou depois de sua reeleição, em 98. Assumiu o cargo depois da doença de Covas e de sua morte, em 2001. E em 2002 foi eleito governador. Como comandou o programa de desestatização - função mais importante do que a de um vice decorativo -, pretende somar tudo e usar sua experiência administrativa de uma década como credenciais para o Planalto. Se vencer a queda-de-braço mais importante de sua carreira, contra Serra, Alckmin vai brigar com números.