Título: BC não quis expor divergências sobre corte de juro
Autor: Beatriz Abreu, Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/01/2006, Economia & Negócios, p. B5

Busca de consenso sobre tamanho da redução da taxa Selic fez reunião durar quase cinco horas

BRASÍLIA - Muitos fatores são listados, sem contestação, para justificar as 4 horas e 46 minutos da segunda mais longa reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) no governo Lula. Um deles foi determinante: a construção de um consenso entre os diretores do Banco Central sobre a dosagem e a definição de um cronograma de queda consistente da Selic, o juro básico da economia, para este ano. O debate não se restringe à questão das pressões políticas sobre o BC. Ele avança sobre o terreno movediço da campanha eleitoral e da necessidade de o presidente Lula poder concorrer à reeleição com um cenário de céu de brigadeiro na economia ¿ ou seja, com a economia ¿bombando¿.

A dificuldade de ter unanimidade na queda de 0,75 ponto porcentual, passando de 18% para 17,25%, surgiu no primeiro momento. Na reunião de dezembro do ano passado, dois diretores já defendiam o rompimento com a postura conservadora do Copom. Essa tese foi voto vencido mais uma vez.

O que diferenciou foi o entendimento da diretoria de que, neste momento, não deveria expor à sociedade e ao governo que a discordância ainda prevalecia entre os integrantes do Copom. Por isso, foram horas e horas de discussão até que se conquistou a unanimidade em relação à tese básica de que, de fato, é melhor uma postura de cautela neste início de ano.

¿É importante ter consenso¿, resumiu um ministro. ¿O fundamental é que a queda seja contínua¿. Esse consenso não se formou apenas entre os diretores do Banco Central. Ele foi construído, também, no gabinete de Lula. Na noite de quarta-feira, o próprio presidente acalmava um de seus ministros, garantindo que ¿o importante é não interromper o processo de queda dos juros¿.

Ele acredita que se a ata do Copom explicitar que a tendência é de queda consistente da Selic, haverá uma mudança de clima, e o País voltará a crescer.

Esse raciocínio permeou a longa discussão dos diretores do Banco Central. Segundo fontes da área econômica, somente em março será possível ter um quadro mais claro do impacto sobre a economia das sucessivas quedas na Selic, adotadas a partir de setembro do ano passado.

Qualquer ousadia, agora, poderia ser um excesso que aumentaria o risco de ter de elevar os juros em pleno ano eleitoral. ¿Em 90 dias, o quadro estará melhor definido¿, confirmou um economista do governo.

O Copom volta a se reunir nos dias 7 e 8 de março. Nessa reunião, os diretores terão condições de avaliar melhor o que está acontecendo com os preços neste início de ano. Os diversos índices dão sinais de uma aceleração da inflação. Mas ainda é cedo para dizer que se trata de uma tendência ou se é apenas uma pressão sazonal, típica da virada de ano.

Se a reunião deste mês despertou as atenções, a de abril, marcada para os dias 18 e 19, será decisiva. Até lá, o BC já saberá se a inflação está ou não dentro da trajetória para o cumprimento da meta deste ano, que é 4,5%, com intervalo de 2 pontos porcentuais para cima ou para baixo.

E o IBGE terá concluído o processo de revisão de dados da economia no ano passado.