Título: Governo zera a dívida em dólares
Autor: Adriana Fernandes e Fábio Graner
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/01/2006, Economia & Negócios, p. B1

BRASÍLIA - O governo federal zerou sua dívida interna corrigida pelo câmbio, anunciou ontem o Banco Central (BC). O fato, inédito, foi conseguido em apenas dois meses, a partir da troca de papéis no mercado, e garantiu ao Palácio do Planalto eliminar um ponto de vulnerabilidade que, na eleição passada, provocou altos e baixos na política econômica. Em razão das incertezas de investidores domésticos e estrangeiros, em 2002 o governo ofereceu títulos cambiais para eliminar os riscos da eleição. Em setembro de 2002, às véspera da eleição, a dívida em dólar chegou a 40,67% do total.

O elevado passivo em dólar não era bom e foi objeto de alertas do Fundo Monetário Internacional (FMI). A eliminação da dívida em dólar foi possível graças aos chamados leilões de swap reverso ¿ troca de dívida em dólar por uma corrigida pela Selic.Foi a venda desses contratos, a partir de meados de novembro de 2005, que permitiu ao BC acabar com essa dívida. Ou seja, ele trocou uma dívida corrigida pelo dólar por outra corrigida pela taxa Selic.

Assim, o BC deixou de ser devedor em dólar para ser credor de US$ 1 bilhão, segundo o chefe do Departamento de Operações do Mercado Aberto (Demab) do BC, Ivan Luis Gonçalves de Oliveira Lima. Ele se refere aos créditos que o BC tem a receber quando vencerem os contratos de swap reverso em poder do mercado. Esses contratos vencem até 2008.

A zeragem da dívida foi bem recebida pelo mercado. ¿Ajuda a reduzir o passivo externo do setor público¿, observou o economista da Arx Capital, Alexandre Sant'Anna.

EXTERNA

Embora a dívida zerada seja a interna, a externa também diminui porque o Brasil tem créditos em dólar. É outro indicador positivo de solvência do País. Sant´Anna calcula, além disso, que o BC poderá zerar toda a dívida externa do setor público em um mês e meio. ¿O BC só precisa continuar a fazer leilões diários de swap cambial reverso, comprar dólares no mercado à vista e contar com as compras do Tesouro Nacional no mercado de câmbio¿, disse.

Segundo Sant'Anna, algumas instituições financeiras estimavam que, até a semana passada, a dívida externa liquida somava US$ 18 bilhões. O pagamento antecipado da dívida com o FMI também contribuiu para a redução. Ele acredita que esse valor já esteja abaixo de US$ 18 bilhões.

¿De lá para cá, muita coisa já aconteceu¿, comentou. A estratégia do governo caminha para a zeragem de toda a dívida externa. Além de quitar os US$ 15,5 bilhões que devia ao FMI, o Brasil já anunciou que quitará sua dívida com o Clube de Paris, estimada em US$ 1,7 bilhão, até o fim deste mês.

NOTAS

Com o processo de queda do juro básico, o Tesouro Nacional nunca vendeu tantos títulos corrigidos pelo IPCA ¿ índice oficial de inflação ¿ como nos últimos 60 dias. Em janeiro, a venda desse papel ¿ chamado de Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B) ¿ deve bater o recorde de R$ 40 bilhões. Somados aos R$ 24,3 bilhões adquiridos pelos investidores em dezembro, a venda desses títulos atingirá R$ 65 bilhões em dois meses.

A maior venda desse papel faz parte da estratégia do governo de reduzir a dívida vinculada à Selic. Os dados divulgados ontem mostram que os papéis ¿selicados¿ estão menos atraentes por causa da redução gradual, mas contínua, do juro básico. Com isso, tem sido menor a oferta das Letras do Tesouro Nacional, as LFTs, papéis com rentabilidade definida pela Selic.

¿A expectativa de queda do juro real está atraindo mais investidores para as NTN-Bs¿, admitiu o coordenador da Dívida Pública do Tesouro Nacional, Paulo Valle.