Título: EUA descartam nova negociação com o Uruguai
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/01/2006, Economia & Negócios, p. B4

Departamento de Estado diz que acabou de firmar um acordo com o país e não dá para fazer outro agora

Em meio a especulações e declarações sobre o interesse do Uruguai em negociar um acordo de comércio com os Estados Unidos, nenhum dos participantes do debate parece ter-se lembrado de perguntar aos americanos se querem tal acordo. A julgar por informações de funcionários da administração George W. Bush e do Congresso, a resposta é um diplomático não.

Não se trata de desfeita ou desinteresse em estreitar as relações econômicas com o Uruguai. "Acabamos de assinar um acordo de investimento com o Uruguai", disse Eric Watnik, um porta-voz do Departamento de Estado. "É um acordo importante", acrescentou, referindo-se ao tratado que o ministro das Relações Exteriores do Uruguai, Reinaldo Gargano, e o secretário de Estado-adjunto para o Hemisfério Ocidental, Thomas A. Shannon, firmaram no dia 4 de novembro, em Mar del Plata, Argentina, à margem da 4ª Cúpula das Américas.

O acordo, que ainda precisa ser ratificado pelos Congressos dos dois países, foi apresentado por Shannon como demonstração "da determinação da administração Bush de fortalecer laços de comércio e investimentos com parceiros desejosos (de fazê-lo), como o Uruguai", e "do compromisso dos EUA de criar oportunidades econômicas com os países do hemisfério que estão dispostos a ajudar a si mesmos implementando políticas econômicas sólidas".

Desde então, respondendo, aparentemente, ao interesse uruguaio em negociar um acordo bilateral ainda mais ambicioso, Washington convidou o governo de Montevidéu a mandar um observador para as negociações do acordo de livre comércio com o Peru, já concluídas, e com a Colômbia e o Equador, que estão na fase final.

Não se sabe se as informações colhidas pelo observador uruguaio sobre o tipo e a profundidade de concessões pedidas por Washington aos países andinos pesou na decisão de Montevidéu de pôr a idéia de um acordo com os Estados Unidos no congelador, depois de tê-la trombeteado. O fato é que os Estados Unidos "não estão negociando atualmente um acordo bilateral de livre comércio com o Uruguai", disse o porta-voz do Departamento de Estado.

Segundo assessores legislativos, é improvável que isso mude no futuro previsível. "Já há vários outros acordos na fila, com a Tailândia, os Emirados Árabes, o Marrocos e Egito, que são prioritários para a administração. No hemisfério, creio que não há espaço, no momento, para mais do que as negociações com os andinos e a Rodada Doha, que é vital para o Brasil e a Argentina", disse.

O assessor lembrou ainda que a Autoridade de Promoção Comercial (TPA), que habilita o executivo a negociar novos acordos, expira em julho do ano que vem e parece ter poucas chances de ser renovada. "Mesmo se estivesse na agenda e começasse já, as negociações de um acordo bilateral com o Uruguai provavelmente não seriam concluídas a tempo de serem submetidas ao Congresso sob a TPA", observou Watnik.

DEPENDÊNCIA

O Uruguai é um país que precisa desesperadamente exportar e atrair investimentos produtivos. Seu vizinho do norte, o Brasil, está ciente disso, como vem acentuando o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim.

No dia da posse do presidente Tabaré Vázquez, em fevereiro de 2005, o presidente Lula inaugurou uma fábrica da AmBev em Paysandú (Uruguai). Mas o país, com a celeuma do acordo com os EUA, deixou claro que quer menos restrições a produtos como o arroz e os lácteos no mercado brasileiro e mais iniciativas empresariais do Brasil em seu território.

Atualmente, entre 70% a 80% da produção uruguaia de carne bovina é embarcada para os EUA, que se tornou o principal destino das exportações do país em 2005. O Brasil ficou em segundo lugar.

No Uruguai, sabe-se que a bonança com o Mercosul pode acabar de uma hora para outra. Daí a busca por novos mercados, o que não significa acordos bilaterais. Em fevereiro, Gargano liderará uma missão comercial que vai à Rússia.