Título: A faca e o queijo na mão
Autor: Amir Khair
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/01/2006, Economia & Negócios, p. B2

Atendendo reivindicação antiga da classe média, ao final de 2004, o governo federal editou a Medida Provisória 232 (MP 232), que corrigia em 10% a Tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física. Para compensar a perda de arrecadação que esta medida acarretaria, criava nesta mesma MP uma tributação adicional sobre os prestadores de serviços. Face a reação decorrente, só foi efetuada a correção da Tabela do Imposto de Renda, sob o risco de perda de arrecadação.

Encerrado 2005, constatou-se que essa arrecadação deverá crescer 8% acima da inflação medida pelo IPCA. A razão está no aumento do emprego formal e da massa salarial ocorrido no ano passado.

Em breve deverá ocorrer nova decisão sobre a Tabela do Imposto de Renda, pretendendo o governo federal corrigi-la em 7%. As centrais sindicais reivindicam 10%. Como neste ano as previsões são de um crescimento superior ao de 2005, com maior geração de emprego e de massa salarial, podemos esperar crescimento do Imposto de Renda sobre o trabalho acima da inflação, mesmo com uma correção de 10% novamente.

No último mandato do governo FHC ocorreu elevação das alíquotas da Cofins, PIS e CPMF e a carga tributária passou de 29,7% do PIB em 1998 para 35,6% em 2002, com crescimento de 5,9 pontos porcentuais, que foi a maior elevação registrada na história do País. Com as arrecadações tributárias realizadas até novembro é possível prever para 2005 que a carga tributária poderá ficar acima de 37%. Para que o governo cumpra o objetivo de não elevar mais a carga tributária são necessárias novas e fortes desonerações tributárias, além das já anunciadas e aprovadas.

Embora não esteja na pauta das discussões, o governo federal poderia reduzir 2 pontos porcentuais na alíquota do INSS dos empregados e dos empregadores. Cálculos preliminares indicam uma aparente perda de arrecadação de R$ 4 bilhões. Como as estimativas não consideram a arrecadação adicional que pode advir pela maior atividade econômica e pela menor informalidade, é bem provável que a arrecadação federal em seu conjunto cresça, pois, nessa hipótese, atinge favoravelmente todos os tributos, inclusive os estaduais e municipais.

As vantagens da desoneração do INSS são significativas: aumenta o salário líquido de todos e não apenas do número mais reduzido beneficiado com a correção da Tabela do Imposto de Renda; reduz o custo de mão-de-obra das empresas formais; amplia a demanda com reflexos imediatos no crescimento econômico; reduz a carga tributária; amplia o emprego formal; reduz as despesas de pessoal dos municípios que têm 37% de servidores celetistas; e melhora a competitividade de nossas empresas. Os resultados servirão para efetuar novas desonerações nas alíquotas do INSS.

Além da diminuição nas alíquotas do INSS, o governo poderia reduzir em 7% as alíquotas das contribuições, passando a Cofins de 7,6% para 7,1%, o PIS de 1,65% para 1,50% e a CPMF de 0,38% para 0,35%. Estes tributos fazem parte integrante dos preços dos bens e serviços e suas reduções contribuirão para baixar a inflação e não implicarão perda de arrecadação, pois ajudam a viabilizar o crescimento econômico e a redução da inadimplência e da informalidade.

Pelo lado das despesas a Previdência Social vai ter suas contas melhoradas neste ano, apesar do aumento real do salário mínimo. O censo dos aposentados indica que o número de beneficiários que compareceu até agora à rede bancária para atualizar os dados é muito inferior ao esperado inicialmente - cerca de 45% ainda não se apresentaram. Bancos responsáveis pela operação estimam que, ao término do processo, as despesas da Previdência estarão reduzidas em cerca de R$ 20 bilhões, equivalentes a 1% do PIB ou um terço do déficit previdenciário. O Ministério da Previdência deve se pronunciar sobre a provável economia somente em março.

O ajuste do setor público brasileiro já permite aumento do crescimento econômico, com manutenção das receitas reais, corte de gastos e de carga tributária, mantendo-se o compromisso do equilíbrio fiscal, com redução da relação dívida/PIB - objetivo final do saneamento das contas públicas. O governo tem a faca e o queijo na mão: é só usá-los.