Título: 'Estratégia do passado não salvará a Ford'
Autor: Cleide Silva
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/01/2006, Economia & Negócios, p. B13

Montadora volta a demitir e fechar fábricas para retornar ao lucro

Fechar fábricas, dispensar dezenas de milhares de operários da linha de montagem, diminuir as camadas hierárquicas de colarinho branco, consolidar a base de fornecedores, arrancar uma outra rodada de negociações sobre salários e concessões de benefícios do sindicato. Lamento, mas já ouvimos tudo isso antes - da Chrysler, da General Motors e até mesmo da Ford ainda em 2001, quando o jovem Bill Ford destituiu Jacques Nasser e devolveu a montadora ao controle da família.

O problema de tais medidas "ousadas" é que elas são o resultado do fracasso de "reversões positivas" e "transformações" do passado e não os fundamentos para novas medidas. São adaptações de tamanho que reconhecem a perda de parcelas de mercado. O fato de as três empresas terem embarcado em "reestruturações" bastante semelhantes é um ótimo indicativo de que muito pouco mudou fundamentalmente nas "Três Não-Tão-Grandes".

Essas empresas sempre projetaram, fabricaram, comercializaram e distribuíram seus produtos da mesma forma, segundo o mesmo modelo de negócio. Por causa da "negociação padrão", elas todas tinham as mesmas normas trabalhistas e a mesma estrutura do custo de mão-de-obra. Quando uma oferecia incentivos de preço, todas elas faziam o mesmo. Quando uma tinha sucesso com minivans ou veículos utilitários esportivos, todas elas a imitavam. Seus executivos vivem nas mesmas comunidades, pertencem aos mesmos clubes, seguiram a mesma trajetória profissional, criando uma das culturas mais entranhadas do empresariado americano.

Durante anos, todos eles receberam relatórios de consultores demonstrando que seus custos com mão-de-obra e com seus fornecedores cativos de peças dos EUA eram insustentáveis. Todos eles estavam conscientes dos perigos de confiar demais nos veículos utilitários esportivos, bebedores de gasolina. Todos eles compreendiam o problema do excesso de capacidade mundial, a premência para passar para uma fabricação mais flexível e a necessidade de diminuir o tempo para o desenvolvimento de novos produtos.

Mas, em vez de atacar esses difíceis problemas, eles continuaram surgindo com "soluções" que pareciam inteligentes, mas que, a longo prazo, só tornaram as coisas piores: baixando os salários hoje, em troca de cláusulas prometendo a manutenção do emprego e benefícios mais generosos na aposentadoria, apertando tanto os fornecedores de peças que eles perderam a capacidade de inovação.

Nos seus comentários na segunda-feira aos jornalistas e analistas de Wall Street, Mark Fields, o homem encarregado de refazer o negócio da Ford nos Estados Unidos, pareceu reconhecer tudo isso, prometendo que, desta vez, as coisas serão diferentes. Ele advertiu que os dias de glória das "Três Grandes" acabaram para sempre, e disse que o desafio não é consertar a velha Ford, mas construir uma nova a partir do zero.