Título: Gasoduto continental em discussão
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/01/2006, Economia & Negócios, p. B7

Representantes do Brasil, Argentina e Venezuela começarão a discutir hoje em Buenos Aires os primeiros passos para concretizar o ambicioso projeto do gasoduto continental, que vai ligar as jazidas venezuelanas de gás na foz do Rio Orinoco, passando pelo interior do Brasil, até chegar às margens do Rio da Prata, para abastecer as indústrias da Grande Buenos Aires. Na reunião, segundo o jornal Página 12, de intensos vínculos com o governo do presidente Néstor Kirchner, a delegação argentina vai propor uma redução dos prazos previstos nas reuniões trilaterais entre os presidentes Kirchner, Luiz Inácio Lula da Silva e o venezuelano, Hugo Chávez em dezembro, que calculavam o fim da monumental obra entre 2010 e 2012.

Kirchner, por causa do quase que permanente estado da Argentina à beira da crise de desabastecimento energético, pretende que o gasoduto continental fique pronto o mais rápido possível. Os principais especialistas da área energética afirmam que em menos de 10 anos a Argentina passará a importador energia, já que suas reservas de gás estão quase no fim.

À necessidade de Kirchner acrescenta-se o entusiasmo de Chávez pelo projeto. O enfático presidente venezuelano já batizou a obra de "El Gran Gasoducto del Sur" (O Grande Gasoduto do Sul).

Além disso, o governo Kirchner vai insistir para que a Bolívia também seja integrada ao gasoduto (na categoria de provedor), além do Paraguai e Uruguai (como consumidores).

Na reunião de Buenos Aires (que será a primeira de uma rodada de três, a serem realizadas em cada capital), os representantes dos três países vão tentar definir mercados, recursos e condições de comercialização, além de tarifas, tecnologias que serão aplicadas, formas de financiamento da obra, questões ambientais e coordenação das diferentes regulações do setor em cada país que participará do plano do gasoduto continental.

O custo do projeto, segundo avaliações dos três governos, estaria ao redor de US$ 20 bilhões. O gasoduto teria entre 8 mil e 9 mil quilômetros de extensão.

TRAJETO

O percurso do gasoduto iniciaria na região de Puerto Ordaz, na área oriental da Venezuela, e dali iria para o sul, em direção a Manaus.

Dali, um ramal iria em direção das capitais do Nordeste brasileiro, enquanto que a linha principal continuaria para o Sul, encaminhando-se para Brasília. Depois partiria em direção às capitais do Sudeste, para depois avançar para o Sul, na direção da Argentina, até chegar a Buenos Aires.

O plano do gasoduto causa polêmica em diversos setores políticos e empresariais na Argentina. O tradicional e influente jornal La Nación pôs no domingo, na capa do suplemento de Economia a manchete "Gasoduto continental: obra crucial ou conversa fiada?"

ANTIINVASÃO

Também se reunirão hoje em Buenos Aires negociadores do Brasil e da Argentina para tentar definir o formato da Cláusula de Adaptação Competitiva (CAC), que consiste em um mecanismo de salvaguardas no comércio com o qual se impediriam eventuais invasões de produtos de um país membro do Mercosul em outro integrante do bloco. O mecanismo de salvaguardas é exigido pelo governo Kirchner desde setembro de 2004, como forma de evitar supostas avalanches de produtos que inundariam o mercado argentino, causando o que o governo e o empresariado local denomina de "depredação das debilitadas indústrias nacionais".

Os negociadores correm contra o relógio, já que os presidentes Lula e Kirchner combinaram no dia 30 de novembro, durante uma reunião de cúpula na pequena cidade argentina de Puerto Iguzú - para celebrar o dia da "Amizade Brasil-Argentina" - , que a Cláusula de Adaptação Competitiva seria oficialmente anunciada no dia 31 de janeiro, ou seja, amanhã.

Entre os negociadores brasileiros e argentinos as expectativas estão divididas.

Alguns acreditam que a CAC será definida, no mais tardar, em cima da hora, minutos antes do prazo vencer. Outros, menos otimistas - particularmente os argentinos -, consideram que as conversas, diante de uma série de divergências, furarão os prazos estipulados e se prolongarão por mais alguns dias ou semanas.