Título: Candidatos e idéias
Autor: Rogério L. F. Werneck
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/01/2006, Economia & Negócios, p. B2

Não é de falta de candidatos que padece o PSDB. Já tendo se dado ao luxo de excluir da lista nomes como Fernando Henrique Cardoso, Aécio Neves e Tasso Jereissati, os tucanos ainda dispõem de dois sólidos pré-candidatos a presidente. Nada menos que o prefeito da maior cidade do País e o governador do Estado mais importante da Federação. Tudo indica que a escolha será feita até o final de março. A idéia é que a convenção de junho apenas referende o nome ungido em março por próceres do partido. A cúpula do PSDB tem suas razões para defender a idéia de que a escolha seja feita dessa forma. O que parece empobrecedor, porém, é que o partido marche para essa decisão sem aproveitar os próximos dois meses para um mínimo de contraposição das idéias defendidas pelos dois pré-candidatos. Sobressaltado pelo temor de um racha, o PSDB parece inclinado a evitar a todo custo uma confrontação dos pontos essenciais dos programas que os candidatos defenderiam na campanha da eleição presidencial. Pelo andar da carruagem, pode acabar tendo de escolher entre dois pré-candidatos com programas desconhecidos, o que seria lamentável numa agremiação que se percebe como um partido de quadros. A necessidade de uma decisão em março advém da anacrônica exigência legal de desincompatibilização com seis meses de antecedência, que tem sido importante fator de cerceamento da competição política no País. No final de março, o prefeito José Serra ainda terá 33 meses de mandato pela frente. É perfeitamente compreensível que não queira abandonar o cargo sem decisão prévia do partido que lhe assegure a candidatura. Mas a antecipação da decisão não é razão para evitar uma contraposição dos programas que seriam defendidos pelos dois pré-candidatos. É verdade que Serra tem um problema adicional: como não quer nem mesmo se declarar ostensivamente candidato, é possível que prefira não ter de delinear o que seria seu programa de governo. Nada impede, contudo, que o faça com a conotação de sugestão para o programa que o partido deveria defender, venha a ser ele o candidato escolhido ou não. Dadas as regras do jogo que vão sendo fixadas no PSDB, é bem possível que até o governador Geraldo Alckmin, que decidiu abandonar a ambigüidade e se declarar abertamente candidato, se veja sem espaço para defender seu programa de governo, mesmo que já disponha de um. Será lamentável se Alckmin ficar limitado a divulgar seu desempenho como governador e tiver de consumir seus melhores esforços nos próximos dois meses em intermináveis conversas ao pé do ouvido País afora até que a decisão do partido seja tomada. Seria especialmente oportuno se os dois pré-candidatos pudessem ser mais explícitos quanto às mudanças que reputam importantes na área econômica. É bem verdade que já há intensa mobilização de economistas ligados ao PSDB com a discussão do que poderiam ser essas mudanças. Mas a impressão que se tem é que tem havido um cuidado um tanto excessivo em evitar que as proposições que vêm sendo feitas sejam vinculadas a qualquer pré-candidato específico. É como se o que estivesse em preparação fosse tão-somente um variado banco de idéias e propostas a ser posto à disposição do candidato afinal escolhido, para ajudá-lo a compor o programa a ser defendido na campanha a partir de abril. Até lá, bastaria aos pré-candidatos fazer menções vagas e descomprometidas a essas idéias ainda desalinhavadas. É curioso que os próprios pré-candidatos tenham desestimulado tentativas da mídia de diferenciá-los no plano das idéias. A evasiva típica tem sido a de que ambos comungam do "mesmo ideário social-democrata", uma expressão com conteúdo especialmente vazio num partido no qual a política econômica sempre foi fonte de infindáveis controvérsias. Será lamentável se os tucanos continuarem fazendo esse jogo de faz-de-conta até o fim e acabarem escolhendo um dos dois pré-candidatos sem contraposição das idéias que defendem. Por outro lado, é, no mínimo, surpreendente, numa agremiação com as pretensões do PSDB, que os dois pré-candidatos a presidente se disponham a abrir mão da possibilidade de usar a diferenciação entre eles no plano das idéias para angariar apoio dentro do partido e ante a opinião pública. Se pudessem defender com clareza as mudanças que preconizam, o País teria muito a ganhar.