Título: Esquerda ataca Lula em debates de Caracas
Autor: Roldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/01/2006, Nacional, p. A13

Governo é acusado de lentidão na área social e subordinação aos EUA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi duramente criticado ontem, em um debate do Fórum Social Mundial, em Caracas. Participantes atacaram a presença de tropas brasileiras no Haiti, os juros altos e o desemprego. Afirmaram que seu governo se subordina aos Estados Unidos e é uma vergonha para a esquerda mundial.

O professor venezuelano Gilberto Giraldi avaliou que Lula "está na corda bamba" e precisa ouvir mais o povo e reduzir o desemprego se quiser ter chances de se reeleger. O peruano Alfonso Sanchez chamou o governo Lula de "lacaio de Washington". O educador argentino Hugo Xarqy acusou-o de acelerar o pagamento da dívida externa em detrimento de políticas sociais. Outras pessoas manifestaram descontentamento com a lentidão na área social.

O mais irado era o americano Richard Allan, que se declarou marxista. Assim que o ex-ministro e ex-deputado José Dirceu terminou sua exposição no debate sobre Alternativas para a Integração Latino-Americana, Allan começou a desancar o governo. Disse que no Haiti os soldados brasileiros "estão ajudando os EUA a fazerem seu trabalho sujo", chamou de "insano" o pagamento adiantado da dívida externa e criticou os juros, o desemprego e a violência. "Eu não me sentiria seguro no Brasil. O governo não consegue garantir a segurança do seu povo."

Contou que se alegrou com a vitória de Lula, mas se decepcionou depois: "Agora o que vejo é mais um Tony Blair, um amigo de Bush, um defensor do neoliberalismo. É importante que o Lula saiba que não está prejudicando apenas seu partido, mas a esquerda do mundo inteiro. A mensagem que fica é a de que governos de esquerda não cumprem o que prometem", reclamou. "Seria bom se o Lula viesse aqui aprender com Chávez."

Dirceu reagiu afirmando que Allan estava "totalmente equivocado" e defendendo o governo como se fosse seu porta-voz oficial. Fez a mesma coisa quando outras pessoas criticaram Lula. Respondeu que hoje o problema do Brasil não é a dívida externa, mas a rolagem da dívida interna e as taxas de juros. Disse que o pagamento adiantado foi uma forma de o Brasil recuperar sua autonomia política diante das instituições internacionais. E ressaltou que o governo investe três vezes mais que o anterior na área social, que o salário mínimo tem aumento real e o nível de emprego cresceu.

Ele foi tão detalhado em alguns pontos de sua exposição na área econômica que Allan chegou a reclamar depois: "Falou comigo como se eu fosse da Microsoft. Foi muito técnico. Não falou com o coração."