Título: Fundação quer força de ONGs sobre países ricos
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/01/2006, Nacional, p. A8

A Fundação Nacional do Índio (Funai) cobra das organizações não-governamentais (ONGs) estrangeiras que criticam o governo por sua política indígena que também pressionem países ricos a cederem nas negociações que ocorrem esta semana em Genebra. Ontem, representantes de países como Grã-Bretanha, Estados Unidos, Austrália, Nova Zelândia e França endureceram suas posições contrárias à criação de uma declaração dos direitos dos povos indígenas. Para muitos observadores, a atitude ameaça todo o processo de debate sobre a questão, que já dura 15 anos.

O objetivo da declaração é definir direitos dos índios e tocar em temas como controle dos recursos naturais, autodeterminação dos povos e direitos coletivos de grupos indígenas. Vários países desenvolvidos temem que a aprovação desse texto abra uma porta para eventuais demandas de criação de países por grupos indígenas dentro de Estados já estabelecidos.

Com isso, o problema é que as negociações na Organização das Nações Unidas (ONU) entram em sua última semana, depois de vários anos de debates, sem resultados concretos. É esse cenário que a Funai espera alterar com ajuda das ONGs.

Alvo de duras críticas das entidades nas últimas semanas, o presidente da Funai, Mércio Gomes, quer agora que elas assumam ativamente a defesa dos índios, pressionando os países ricos para que mudem de posição. Uma das ONGs cobradas pelo Brasil é a britânica Survival. "Cobrei os representantes da entidade para que pressionem seu próprio governo nas negociações da ONU", contou Mércio.

A Survival respondeu ao presidente da Funai que está em plena campanha exatamente para atingir esse objetivo. Mas Mércio reclamou que não há nenhum representante da entidade em Genebra justamente nesta fase final das negociações.

CRÍTICA

Azelene Kaingang, presidente da Warã Instituto Indígena Brasileiro, diz que boa parte das ONGs que foram a Genebra, como a Anistia Internacional, fica calada nos debates oficiais. "A crítica contra o governo é válida e muito produtiva, mas também precisamos pressionar os países ricos e para isso elas precisam fazer declarações públicas", cobrou Azelene.

Os dois pontos que enfrentam mais resistência são a autodeterminação dos povos indígenas e o controle sobre a terra e os recursos naturais. Americanos e australianos querem que o texto apenas faça uma referência sobre a autodeterminação, mas os índios não aceitam a condição. A China, com 150 milhões de pessoas consideradas autóctones, ainda não se pronunciou sobre o tema.