Título: 'Brasil não deve temer a era Bernanke'
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/02/2006, Economia & Negócios, p. B1

A economia mundial entra hoje na era Bernanke. Como novo presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Ben Bernanke passa a ser o cérebro da política monetária dos Estado Unidos. Para José Alexandre Scheinkman, professor da Universidade de Princeton, o Brasil não deve temer a era Bernanke. Scheinkman fala com conhecimento de causa, pois trabalhou com Bernanke por três anos - foi ele que tirou Scheinkman da Universidade de Chicago e levou para Princeton. "Ben é uma pessoa agradável e muito inteligente, combina conhecimento teórico com muita análise de dados."

Quais são os principais desafios do novo presidente do Fed?

O grande desafio é que a política monetária terá de reagir aos déficits fiscal e de conta corrente dos Estados Unidos.

Ele herdou uma batata quente?

Sim. Em determinado momento, o resto do mundo vai ficar mais relutante em financiar o déficit americano e, dada a situação política atual, acho que os problemas fiscais vão continuar. Bernanke estará comandando o Fed neste momento de ajuste. Pode não ser neste ano nem no ano que vem, mas ninguém espera que o mundo continue financiando os EUA desse jeito. A História mostra que a maioria dos países que chegaram a esse nível de déficit em conta corrente tiveram ajuste na moeda e recessão.

Qual será a diferença entre Bernanke e Greenspan?

No começo, o papel de Bernanke será diferente porque ele não será o guru da economia americana, como Greenspan tinha se tornado. Mas, fora isso, acho que ele vai manter o rumo de Greenspan.

Como o sr. vê a trajetória dos juros americanos no curto prazo?

Não acho que Bernanke tenha de endurecer a política monetária para ganhar confiança do mercado . Há uma expectativa de mais 0,5 ponto porcentual de aumento na taxa americana, 0,25 ponto nesta reunião (anunciado pelo Fed ontem) e mais 0,25 em março. Depois, o Fed deve dar um respiro.

O sr. acha que ele vai adotar algum tipo de meta para a inflação?

É importante dizer que Greenspan tinha metas de inflação na cabeça, só não as explicitava. Acho que Bernanke vai deixar essa meta mais explícita porque o mercado ainda não o conhece e gostaria de ter mais orientação. Greenspan sempre se preocupou em colocar as expectativas do mercado financeiro no lugar certo. Bernanke vai continuar com essa política e talvez seja até mais transparente.

O Brasil deve ter medo da gestão Bernanke no Fed?

O Brasil não deve temer os EUA sob Bernanke. Não deve haver muita mudança. O maior perigo é o ajuste da economia dos EUA. Qualquer queda de crescimento nos EUA contribuiria para a queda no crescimento mundial . E o Brasil só cresce quando o mundo cresce. O ajuste não é um problema específico do Fed, mas uma administração eficiente da política monetária pode facilitar esse ajuste.