Título: Déficit de atenção não é visível, pois é diferente de falta de motivação
Autor: Adriana Dias Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/01/2006, Vida&, p. A22

Ironias à parte, sob o ponto de vista médico, o plantão com mais de 12 horas pode ser uma roubada, tanto para o profissional quanto para o paciente. "A privação de sono durante a noite tem um efeito imediato no dia seguinte, a diminuição no sistema cognitivo, afetando atenção, coordenação e raciocínio, por exemplo", diz o neurologista Flávio Aloe, especialista em medicina do sono do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Privação, entenda-se, é dormir menos do que sete horas e meia. "Independentemente de sexo e raça, 95% dos humanos precisam de sete horas e meia de sono, 3% precisam de mais tempo e só 2% de menos", conta Aloe. Além do número reduzido de horas dormidas, o profissional ainda pode sofrer com a quebra do ciclo de sono. Das 23 às 7 horas da manhã, o organismo tem um declínio natural do raciocínio, mesmo se estiver bem descansado.

Outro problema: a chamada inércia do sono. "Quando uma pessoa é despertada no meio do sono, durante os 30 minutos seguintes sofre uma redução neuropsicomotora. Sabe a cena clássica de tocar o telefone no meio da noite, você atender e no dia seguinte não lembrar direito o que falou? É isso", conta Aloe.

"Se todas as situações forem somadas de uma vez só, essa pessoa pode ficar com até 40% menos capacidade de decisão, atenção e raciocínio. Claro que dormir poucas horas é melhor do que nada. Mas dormir três ou quatro horas só faz com que a capacidade, em vez de 40%, fique 25% pior."

O déficit não pode ser confundido com falta de motivação. Dificilmente ele é percebido, a não ser em testes psicomotores. "Fisicamente, a pessoa pode achar que está muito bem, ainda mais se gostar do que faz e estiver estimulada. Mas não está normal."

Para o especialista em medicina do sono, o tempo limite de um plantão seria de 12 horas. Segundo estudo feito pelo Conselho Federal de Medicina em 2004, no entanto, só 4,1% dos médicos respeitam esse limite (ver quadro acima).