Título: A tolerância como arma política
Autor: Gabriel Manzano Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/01/2006, Nacional, p. A8,9

Outro atento pesquisador dos anos 50 e 60, o cientista político Bolívar Lamounier, destaca o valor da tolerância, marca registrada de Juscelino, na construção de um clima propício ao crescimento do País. Isso ficou claro já em seu 11.º dia de governo, quando um grupo de oficiais se rebelou e desafiou o governo a partir da base de Jacareacanga, no Pará. O movimento durou pouco e JK tirou dele o melhor proveito: anistiou todos os rebeldes, um gesto impensável no tenso clima político de então.

"Foi um episódio importantíssimo", adverte Bolívar. "Se Juscelino tivesse optado pela repressão, mandando prender os revoltosos, eles poderiam se apresentar como mártires, símbolos da rejeição a um 'continuísmo' getulista personificado em JK." Mas este não caiu na armadilha: "Esvaziou no nascedouro o que poderia ser a semente de uma nova radicalização." O Brasil se dividia, desde a morte de Getúlio Vargas, em duas metades irreconciliáveis - de um lado PTB, nacionalismo e sindicatos de esquerda. De outro, a UDN, os liberais e a ala radical dos militares. Para os dois grupos os exemplos de paciência do presidente foram um golpe mortal. E ele repetiria o gesto de anistia no final do governo, quando o mesmo grupo rebelou-se de novo e se refugiu em Aragarças. "No todo, em termos políticos", lembra Bolívar, "o avanço em seu governo havia sido enorme. A democracia que se respirava então estava décadas à frente de ditaduras como as de Salazar em Portugal, de Francisco Franco na Espanha."